segunda-feira, 2 de setembro de 2019

Órbitas circulares e epicíclicas na astronomia antiga

Desde muito cedo, os primeiros astrónomos observaram que os astros se movem em círculos paralelos entre si, elevando-se a este, descendo a oeste e repetindo o movimento com uma periodicidade única diária. Tal observação levou-os a considerar que o movimento dos objectos celestes se pode descrever com base na revolução de uma esfera, dado que o movimento dos astros se efectua em torno de um centro fixo, isto é, à medida que se consideram astros cada vez mais próximos desse centro, as suas órbitas constituirão círculos cada vez menores. O ponto fictício assim determinado recebeu o nome de pólo da esfera celeste. O maior círculo que pode ser considerado como órbita do movimento encontra-se no plano do equador e consitui um círculo máximo. O plano do equador divide a esfera celeste em dois hemisférios e, a cada um deles, encontra-se associado um pólo da esfera em torno do qual centram os círculos paralelos que aí se encontram.

Observações detalhadas das posições dos astros ao longo de períodos de tempo suficientemente longos, permitiram concluir que as estrelas e demais objectos, para além do seu movimento circular diário em torno de dois pólos, de este para oeste, efectuam um movimento circular com um período mais longo, de oeste para este, revolvendo em torno de outros dois pólos. De facto, as posições relativas das estrelas não varia e o Sol, a Lua e os planetas, apesar da complexidade dos seus movimentos, deslocam-se em média de oeste para este. Assumiram deste modo que as estrelas parecem estar associadas a uma esfera que gira em torno de si mesma e que o Sol, a Lua e os planetas, caso se considerasse que o seu movimento fosse regular, se movem ao longo do mesmo círculo máximo que recebe a designação de eclíptica. É claro que os pólos deste novo movimento se encontram sobre a perpendicular a este círculo máximo. A eclíptica, por seu turno, intersecta o equador em pontos que recebem a designação de pontos equinociais. Dá-se a designação de solstícios aos dois pontos da eclíptica que mais se afastam do plano do equador.

Apesar da órbita do Sol ser dada pela eclítpica, o seu movimento não é uniforme, isto é, a sua velocidade parece variar ao longo do tempo. Existem intervalos de tempo em que os planetas asumem um movimento retrógrado relativamente ao seu movimento médio. Para explicar tais movimentos, foram propostos essencialmente dois modelos pelos sábios da antiguidade clássica com o intuito de tentar recuperar a uniformidade dos movimentos dos corpos celestes. O mais simples consiste em considerar a órbita sobre um círculo que não é concêntrico à posição do observador. Um modelo mais complexo consiste em considerar epiciclos. Neste caso, o astro é assumido descrever uma órbita circular em torno de um ponto que, por sua vez, descreve uma órbita circular em torno do observador. É de notar que a construção pode ser extrapolada de modo a considerar círculos cujo centro se mova ao longo de um epiciclo bem como variações em que os epiciclos são assumidos sobre círculos excêntricos com o observador.

Qualquer que seja o caso, a órbita aparente seria o resultado da projecção da órbita real sobre a esfera cujo raio se pode considerar unitário. Seja o referencial centrado no ponto \(O\) onde se encontra o observador. Como os astros se movem em órbitas planas, estas poderão ser descritas por vectores da forma \(\left(x(t),y(t)\right)\). Qualquer ponto \(P\) da órbita é projectado no ponto \(Q\) da esfera dado pela intersecção da linha de visão \(OP\) com o círculo de raio unitário centrado na origem. É fácil constatar que a equação polar do círculo pode ser escrita como

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\cos{\varphi}=\frac{x}{\sqrt{x^2+y^2}}\\ \sin{\varphi}=\frac{y}{\sqrt{x^2+y^2}}\end{array}\right.\]

É claro que, como a órbita nunca passa pela origem, também \(\sqrt{x^2+y^2}\ne 0\) qualquer que seja o valor de \(t\). Para determinar a velocidade angular conhecida a velocidade real, começa-se por considerar a equação

\[\tan{\varphi}=\frac{y}{x}\]

cuja derivada em ordem a \(t\) permite escrever

\[\frac{1}{\cos^2{\varphi}}\varphi'=\frac{xy'-yx'}{x^2}\]

que, como

\[\cos{\varphi}=\frac{x}{\sqrt{x^2+y^2}}\]

se reduz a


\[\varphi'=\frac{xy'-yx'}{x^2+y^2}\]

Se \(\vec{r}=(x,y,0)\) representar o vector posição e \(\vec{v}=\left(x',y',0\right)\), o vector de velocidade então a fórmula anterior admite a representação vectorial

\[\varphi'=\frac{\left\lVert\vec{r}\times\vec{v}\right\rVert}{\left\lVert\vec{r}\right\rVert^2}\]

Suponha-se, por exemplo, que o movimento é circular e uniforme sobre um círculo de raio \(R\) cujo centro se encontra no ponto de coordenadas \((r,0)\) onde \(r\) pode ser considerado positivo. A sua equação pode ser escrita na forma

\[\left\lbrace\begin{array}{l} x=r+R\cos(\omega t)\\ y=R\sin(\omega t)\end{array}\right.\]

Segue-se daqui que as componentes da velocidade são dadas por

\[\left\lbrace\begin{array}{l} x'=-R\omega\sin(\omega t)\\ y'=R\omega\cos(\omega t) \end{array}\right.\]

que, quando substiuídas na expressão para \(\varphi'\), proporcionam

\[\varphi'=\left(1-\frac{r^2+Rr\cos(\omega t)}{R^2+r^2+2rR\cos(\omega t)}\right)\omega\]

Considerando que \(r>0\), o ponto mais afastado do observador, isto é, o apogeu, é atingido quando \(t=0\). O perigeu, por seu turno, ponto da órbtia mais próximo do observador, é atingido quando \(t=\frac{\pi}{\omega}\). Estes são respectivamente \((R+r,0)\) e \((r-R,0)\). A velocidade angular aparente no apogeu é dada por

\[\varphi'(0)=\frac{R}{R+r}\omega\]

e, no perigeu, por

\[\varphi'\left(\frac{\pi}{\omega}\right)=\frac{R}{R-r}\omega\]

É claro que, neste caso, o movimento aparente no apogeu é mais lento do que no perigeu. Existem dois pontos na órbita onde a velocidade angular do movimento aparente \(\varphi'\) iguala a velocidade angular do movimento circular uniforme real. De facto, da equação \(\varphi'=\omega\) obtém-se

\[r^2+rR\cos(\omega t)=0\]

A velocidade angular aparente é igual à angular em todos os pontos se \(r=0\), o que corresponde ao movimento circular uniforme centrado no ponto do observador. Se \(r\ne 0\), tem-se

\[\cos(\omega t)=-\frac{r}{R}\]

que possui solução quando \(r\le R\). Dá-se a designação de anomalia à quantidade \(\varphi(t)-\omega t\), isto é, à diferença entre a posição aparente do corpo e a posição aparente caso o corpo se movesse em torno do observador com velocidade angular constante, considerada no instante \(t\). Se \(t\) for um instante onde é observada uma anomalia máxima então \(\varphi'(t)-\omega=0\). Os instantes determinados com base na fórmula anterior são os únicos onde podem ser observadas anomalias máximas.

O ponto situado à distância angular do apogeu igual a um quadrante no movimento excêntrico corresponde, no movimento real, ao ângulo \(\omega t\) dado pela equação

\[r+R\cos(\omega t)=0\]

isto é, o ângulo é tal que

\[\cos(\omega t)=-\frac{r}{R}\]

e corresponde aos pontos onde a velocidade aparente iguala a velocidade real. O tempo que o corpo demora desde a sua partida à distância aparente de um quadrante do apogeu, passando pelo perigeu até chegar ao quadrante aparente oposto é dado por

\[t=\frac{2}{\omega}\arccos\left(-\frac{r}{R}\right)\]

Esta expressão permite determinar a razão \(\frac{r}{R}\), desde que se conheçam os tempos medidos entre pontos que distam um quadrante do apogeu. Se a linha apsidal (linha definida entre os apses, isto é, entre o apogeu e o perigeu) se encontrasse alinhada com a linha definida pelos solstícios, o tempo iria coincidir com o tempo de transição entre equinócios. No entanto, esse alinhamento não se verifica, sendo possível determinar os parâmetros, conhecidos os tempos de transição entre o equinócio da primavera e o solstício de verão e entre o solstício de verão e o equinócio de outono. Não são necessários os tempos de transição entre os equinócios e o solstício de inverno.

Denotem-se por \(\tau_1\) e \(\tau_2\) respectivamente os tempos de transição enre os equinócios e o solstício. Se se considerar que o eixo das abcissas do referencial se encontra alinhado com o equinócio, têm-se as equações

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x=p+R\cos\omega t\\ y=q+R\sin\omega t\end{array}\right.\]

Dado que o solstício se encontra no ponto tal que \(x=0\) e o equinócio oposto se encontra no ponto tal que \(y=0\) têm-se as equações

\[\left\lbrace\begin{array}{l}p=-R\cos\omega \tau_1\\ q=-R\sin\omega\left(\tau_1+\tau_2\right)\end{array}\right.\]

de onde se obtém

\[\frac{r}{R}=\frac{\sqrt{p^2+q^2}}{R}=\sqrt{\cos^2\omega \tau_1+\sin^2\omega\left(\tau_1+\tau_2\right)}\]

Por seu turno, o ângulo \(\sigma\) definido entre a linha definida pelos solstícios e a linha definida pelo apogeu e perigeu calcula-se com base na conhecida fórmula da geometria analítica, nomeadamente,

\[\cos\sigma=-\frac{\cos\omega\left(\tau_1+\tau_2\right)}{\sqrt{\sin^2\omega \tau_1+\sin^2\omega\left(\tau_1+\tau_2\right)}}\]

Outro modelo para o ajuste da posição dos astros assenta sobre o conceito de ciclóide. Neste caso, o corpo move-se sobre uma circunferência de raio \(r\) cujo centro é animado de um movimento circular de raio \(R\) em torno do observador. À circunferência centrada no observador dá-se a designação de deferente e à circunferência de raio \(r\) cujo centro se move sobre o deferente dá-se a designação de epicíclo.

Se se considerar que a posição de cada círculo é medida relativamente à direcção dada pelo eixo das abcissas, a equação do ciclóide, curva gerada pelo ponto que se move no epiciclo, é dada por

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x=R\cos\left(\omega_1t\right)+r\cos\left(\omega_2t\right)\\ y=R\sin\left(\omega_1t\right)+r\sin\left(\omega_2t\right)\end{array}\right.\]

As derivadas das funções coordenadas proporcionam as componentes das velocidades, nomeadamente,

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x'=-R\omega_1\sin\left(\omega_1 t\right)-r\omega_2\sin\left(\omega_2 t\right)\\ y'=R\omega_1\cos\left(\omega_1 t\right)+r\omega_2\cos\left(\omega_2 t\right)\end{array}\right.\]

A substituição na expressão para a velocidade angular aparente permite obter

\[\varphi'=\omega_1+\left(\omega_2-\omega_1\right)r\frac{r+R\cos\left(\left(\omega_2-\omega_1\right)t\right)}{R^2+r^2+2Rr\cos\left(\left(\omega_2-\omega_1\right)t\right)}\]

Suponha-se que é considerado o epiciclo na descrição da órbita do Sol. Neste caso, sabe-se que revolve ao longo da eclíptica com um movimento periódico com um período igual a um ano. Sabe-se ainda que se move com maior velocidade na vizinhança do perigeu e com menor velocidade na vizinhança do apogeu. Assim, são observadas, ao longo do ano, anomalias na posição do astro relativamente à posição onde se esperaria estar caso o seu movimento fosse uniforme. Se se considerar o início do movimento uniforme no apogeu, as maiores anomalias verificam-se nos pontos que distam um quadrante para um lado e para o outro do apogeu. Nestes pontos tem-se precisamente \(\varphi'-\omega=0\) onde \(\omega\) é a velocidade angular do movimento uniforme.

A primeira aproximação a ser aqui considerada consiste em assumir que \(\omega_1=\omega\). De modo a que a anomalia máxima se encontre a um quadrante do apogeu, isto é, nos pontos da órbita tais que \(x=0\), é necessário ainda que \(\omega_2=\omega\), \(\omega_2=0\), \(\omega_2=2\omega\) ou \(r=0\). O caso \(r=0\) constitui o movimento circular uniforme de raio \(R\). Com \(\omega_2=\omega\) têm-se as equações paramétricas para a órbita

\[\left\lbrace\begin{array}-x=(R+r)\cos(\omega t)\\ y=(R+r)\sin(\omega t)\end{array}\right.\]

que também descreve um movimento circular e uniforme cujo raio é agora \(R+r\). Se \(\omega_2=2\omega\) tem-se, para a velocidade angular aparente,

\[\varphi'=\left(1+\frac{r^2+Rr\cos(\omega t)}{R^2+r^2+2Rr\cos(\omega t)}\right)\omega\]

Neste caso, a velocidade é claramente superior quando o astro se encontra no apogeu e inferior no perigeu. Tal hipótese é, portanto, contrária às observações. Finalmente, com \(\omega_2=0\) têm-se as equações paramétricas para as coordenadas da forma

\[\left\lbrace\begin{array}{l} x=r+R\cos(\omega t)\\ y=R\sin(\omega t)\end{array}\right.\]

que correspondem à hipótese da circunferência excêntrica tratada acima. As previsões resultantes da consideração da hipótese em que \(\omega_1=\omega\) e \(\omega_2=0\) conduzem a resultados bastante condicentes com as observações.

O vector \(\vec{\epsilon}\) que tem origem no centro do epiciclo e extremidade no corpo tem coordenadas \(\left(r\cos\left(\omega_2 t\right),r\sin\left(\omega_2 t\right)\right)\). Se \(\vec{\rho}\) for o vector de posição associado ao epiciclóide, isto é, o vector definido pela origem do referencial e pelo ponto móvel,

\[\vec{\rho}=\left(R\cos\left(\omega_1t\right)+r\cos\left(\omega_2t\right),R\sin\left(\omega_1t\right)+r\sin\left(\omega_2t\right)\right)\]

então

\[\vec{\epsilon}\cdot\vec{\rho}=r^2+Rr\cos\left(\left(\omega_2-\omega_1\right)t\right)\]

Conclui-se que, nos pontos onde a anomalia é máxima, os vectores \(\vec{\epsilon}\) e \(\vec{\rho}\) são perpendiculares entre si sempre que \(r\ne 0\) ou \(\omega_1\ne\omega_2\).

Um modelo para o movimento lunar é descrito por um epiciclo geral

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x=R\cos\left(\omega_1t\right)+r\cos\left(\omega_2t\right)\\ y=R\sin\left(\omega_1t\right)+r\sin\left(\omega_2t\right)\end{array}\right.\]

onde \(\omega_1\) é a velocidade angular correspondente a um período sideral e \(\omega_2\) é a velocidade angular correspondente ao retorno da anomalia relativa ao movimento médio à sua situação inicial.  Verificou-se por observação que \(\omega_1\gt\omega_2\).

Mostra-se que o modelo do epiciclo pode ser substituído por um modelo dado pelo movimento uniforme sobre uma circunferência excêntrica com velocidade angular igual a \(\omega_1-\omega_2\) que, por si só, roda em torno da origem com velocidade angular igual a \(\omega_2\). De facto, observando que \(\omega_1=\omega_2+\left(\omega_1-\omega_2\right)\), tem-se

\[\begin{array}{l}\cos\omega_1t=\cos\omega_2t\cos\left(\omega_1-\omega_2\right)t-\sin\omega_2t\sin\left(\omega_1-\omega_2\right)t\\ \sin\omega_1t=\sin\omega_2t\cos\left(\omega_1-\omega_2\right)t+\sin\left(\omega_1-\omega_2\right)t\cos\omega_2t\end{array}\]

A sua substituição na equação do epiciclo proporciona

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x=\left(r+R\cos\left(\omega_1-\omega_2\right)t\right)\cos\omega_2-R\sin\left(\omega_1-\omega_2\right)t\sin\omega_2t\\ y=R\sin\left(\omega_1-\omega_2\right)t\sin\omega_2t+\left(r+R\cos\left(\omega_1-\omega_2\right)t\right)\cos\omega_2t\end{array}\right.\]

que claramente resulta da aplicação da rotação de um ângulo igual a \(\omega_2t\) à curva

\[\left\lbrace\begin{array}{l} x=r+R\cos\left(\omega_1-\omega_2\right)t\\ y=R\sin\left(\omega_1-\omega_2\right)t\end{array}\right.\]

como afirmado.

À semelhança do que foi realizado no caso da órbita circular excêntrica, a razão entre \(r\) e \(R\) pode ser determinada a partir dos tempos de transição entre três pontos. Estes dados determinavam-se com maior precisão durante eclipses lunares. Suponha-se, portanto, que o primeiro eclipse tenha ocorrido num determinado instante. Do primeiro eclipse ao segundo deu-se um deslocamento angular aparente de \(\theta_1\) no intervalo de tempo \(\tau_1\). Por seu turno, conhece-se também o deslocamento angular aparente de \(\theta_2\) medido relativamente ao primeiro num intervalo de tempo dado por \(\tau_2\).

Seja \(\sigma\) o ângulo que é necessário rodar o referencial de modo a alinhar o eixo das abcissas com a posição do primeiro eclipse. A equação do epiciclo no novo referencial passa a ser escrita como

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x=R\cos\left(\omega_1t-\sigma\right)+r\cos\left(\omega_2t-\sigma\right)\\ y=R\sin\left(\omega_1t-\sigma\right)+r\sin\left(\omega_2t-\sigma\right)\end{array}\right.\]

A escolha conveniente de uma nova origem temporal no instante \(\tau_0\) tal que \(\omega_1\tau_0=\sigma\) permite escrever

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x=R\cos\left(\omega_1t\right)+r\cos\left(\omega_2t+\psi\right)\\ y=R\sin\left(\omega_1t\right)+r\sin\left(\omega_2t+\psi\right)\end{array}\right.\]

onde \(\psi=\omega_2\tau_0-\sigma\) é um valor que deverá ser determinado. A informação obtida entre eclipses permite escrever

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\tan\theta_1=\frac{R\cos\left(\omega_1\tau_1\right)+r\cos\left(\omega_2\tau_1+\psi\right)}{R\sin\left(\omega_1\tau_1\right)+r\sin\left(\omega_2\tau_1+\psi\right)}\\ \tan\theta_2=\frac{R\cos\left(\omega_1\tau_2\right)+r\cos\left(\omega_2\tau_2+\psi\right)}{R\sin\left(\omega_1\tau_2\right)+r\sin\left(\omega_2\tau_2+\psi\right)}\end{array}\right.\]

Trata-se de um sistema de duas equações que permite a determinação das quantidades \(\psi\) e \(\alpha=\frac{r}{R}\).

Um modelo comum usado para a descrição do movimento da maioria dos planetas na antiguidade baseava-se no conceito de equante. Para o descrever, considere-se a semi-recta que passa no ponto \(D\) de coordenadas \(\left(2p,0\right)\) e que roda com velocidade constante. A sua equação paramétrica escreve-se como

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x=2p+\lambda\cos(\omega t)\\ y=\lambda\sin(\omega t)\end{array}\right.\]

Note-se que \(\lambda\ge 0\) é aqui o parâmetro que define a recta. Seja agora o círculo de raio \(R\) e centro no ponto \(Z\) de coordenadas \(\left(p,0\right)\) cuja equação algébrica é da forma

\[
(x-p)^2+y^2=R^2
\]

A intersecção da recta móvel com a circunferências excêntrica de centro em \(Z\) produz um movimento circular mas não uniforme. A sua equação obtém-se, resolvendo o sistema de equações

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x=2p+\lambda\cos(\omega t)\\ y=\lambda\sin(\omega t)\\ (x-p)^2+y^2=R^2 \end{array}\right.\]

A substituição da primeira e segunda equações na terceira resulta em

\[\lambda^2+2\lambda p\cos(\omega t)+p^2=R^2\]

É claro que, do ponto de vista geométrico, \(\lambda\) representa a distância do ponto \(D\), que será designado por equante, ao ponto situado na circunferência excêntrica de centro em \(Z\). A equação define implicitamente \(\lambda\) como função de \(t\). A equação da trajectória é dada, portanto, por

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x=2p+\lambda\cos(\omega t)\\ y=\lambda\sin(\omega t)\end{array}\right.\]

onde \(\lambda\) é a função implicitamente definida pela equação

\[\lambda^2+2\lambda p\cos(\omega t)+p^2=R^2\]

A função \(\lambda\) satisfaz a equação diferencial

\[\lambda'=\frac{p\lambda\sin(\omega t)}{\lambda+p\cos(\omega t)}\omega\]

Um pouco de álgebra permite mostrar que a velocidade angular aparente é dada por

\[\phi'=\left(1-2p\frac{\lambda p+\left(R^2+p^2\right)\cos(\omega t)}{\left(2p^2\sin^2(\omega t)+R^2+p^2\right)\lambda+p\left(3R^2-p^2\right)\cos(\omega t)}\right)\omega\]

A velocidade angular aparente é igual à velocidade angular como esta é observada por quem se encontre no ponto do equante quando

\[\lambda=-\frac{\left(p^2+R^2\right)\cos(\omega t)}{p}\]

que, quando combinada com a equação que define implicitamente \(\lambda\) como função do tempo, conduz a

\[\cos(\omega t)=\pm\frac{p^2}{\left(R^2-p^2\right)\left(R^2+p^2\right)}\sqrt{R^2-p^2}\]

e permite a obtenção dos instantes onde a anomalia é máxima relativa ao movimento circular uniforme centrado no observador para o caso do movimento circular excêntrico cuja velocidade é uniforme relativamente ao equante.

A consideração de um epiciclo cujo centro se move ao longo da circunferência excêntrica, centrada no ponto \((p,0)\) com velocidade uniforme quando vista do equante proporciona uma ajuste aceitável aos dados observados para a anomalia da maioria dos planetas conhecidos na antiguidade. A sua equação assume a forma geral

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x=2p+\lambda\cos(\omega_1t)+r\cos\left(\omega_2t\right)\\ y=\lambda\sin(\omega_1t)+r\sin\left(\omega_2t\right)\\ \lambda^2+2\lambda p\cos(\omega_1t)+p^2=R^2\end{array}\right.\]

Se se fizer

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x_2=r\cos\left(\omega_2t\right)\\ y_2=r\sin\left(\omega_2t\right) \end{array}\right.\]

um pouco de álgebra permite determinar, após substituição na fórmula que proporciona a velocidade aparente,

\[\varphi'=\omega_1+\frac{\lambda'h+\left(\omega_2-\omega_1\right)\left(x_2x+y_2y\right)-2p\omega_1x}{x^2+y^2}\]

onde se fez, para abreviar,

\[h=2p\sin\left(\omega_1t\right)-r\sin\left(\left(\omega_2-\omega_1\right)t\right)\]

Por exemplo, para que a anomalia máxima seja atingida a um quadrante do afélio, isto é, quando \(x=0\), é possível considerar que \(\omega_2=0\) e \(2p=-r\). Neste caso, fica

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x=\lambda\cos(\omega_1 t)\\ y=\lambda\sin(\omega_1 t)\end{array}\right.\]

bem como

\[\varphi'=\left(1+\frac{2rx}{x^2+y^2}\right)\omega_1\]

Neste caso, a anomalia é máxima quando \(x=0\) já que \(r=0\) corresponde ao movimento circular e uniforme centrado no observador. Além disso, dado que \(x_2x+y_2y=-rx\), conclui-se que o raio vector que define o epiciclo é perpendicular ao raio vector associado à órbita no ponto de anomalia máxima.

O movimento dos planetas, por seu turno, é descrito pela expressão mais geral onde \(\omega_1\) é a velocidade angular relativa ao movimento médio dado pelo retorno em longitude. O valor de \(\omega_2\) está associado ao período médio da anomalia sinódica e realiza-se no sentido contrário, isto é, trata-se de um valor negativo. Considerando \(\omega_1\) e \(\omega_2\) positivos, tem-se, para o caso do movimento dos planetas,

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x=2p+\lambda\cos(\omega_1t)+r\cos\left(\omega_2 t\right)\\ y=\lambda\sin(\omega_1t)-r\sin\left(\omega_2 t\right)\\ \lambda^2+2\lambda p\cos(\omega_1t)+p^2=R^2\end{array}\right.\]

É óbvio que a linha apsidal, isto é, a linha que une o perigeu e o apogeu, coincide com o eixo das abcissas do referencial considerado. Não é difícil constatar que a órbita é simétrica em torno do eixo das abcissas. Assim, em pontos à mesma distância angular para um lado e para o outro do apogeu ou perigeu, observam-se as mesmas elongações medidas relativamente ao movimento médio com velocidade angular \(\omega_1\). Como a velocidade angular do sol médio é constante, as elongações máximas relativas a esta referência são atingidas em pontos que distam o mesmo ângulo para um lado e para o outro tanto do apogeu como do perigeu. Este facto permite determinar a direcção da linha apsidal como direcção perpendicular às direcções definidas por observações das elongações máximas determinadas de um lado e do outro.

Como \(p\ll R\), observa-se que, quando a velocidade angular do movimento circular que é uniforme quando observado do equante é igual à velocidade angular \(\omega_1\), se tem aproximadamente \(\cos\omega_1 t=0\). Nestes pontos, que distam a um quadrante do apogeu em relação ao equante, tem-se \(\lambda\approx R\), \(\lambda'=\omega_1p\) e

\[\varphi'\approx \omega_1+\left(\omega_1+\omega_2\right)\frac{xx_2+yy_2}{x^2+y^2}\]

Se, em cada um dos pontos, o planeta apresentar a sua anomalia máxima então terá de ser verificada a equação \(xx_2+yy_2=0\). Suponha-se que nos instantes \(\tau_1\) e \(\tau_2\), o planeta se encontra respectivamente à distância de um quadrante do apogeu visto do equante num lado e no outro. Suponha-se também que são observadas as máximas anomalias nos ângulos \(\omega_2\tau_1\) e \(\omega_2\tau_2\) em cada um deles. Neste caso tem-se

\[\left\lbrace\begin{array}2p\cos\omega_2\tau_1-R\sin\omega_2\tau_1+r=0\\ 2p\cos\omega_2\tau_2-R\sin\omega_2\tau_2+r=0\end{array}\right.\]

Uma vez que são determináveis, por medição, os ângulos \(\omega_2\tau_1\) e \(\omega_2\tau_2\), o sistema pode ser resolvido de modo a determinar o valor das razões \(\frac{p}{R}\) e \(\frac{r}{R}\). É possível determinar o valor de cada um dos parâmetros, ao invés das suas razões, se se considerar a anomalia máxima medida quando o planeta se encontra no apogeu relativamente à velocidade que seria de esperar se não existisse o epiciclo. Conhecidos os parâmetros, a medição de um ponto apenas é suficiente para determinar velocidade angular \(\omega_2\) da anomalia.

O método anterior aplicava-se apenas aos planetas internos já que as suas elongações são limitadas. Não funciona, portanto, no caso dos planetas externos cujas elongações podem assumir qualquer valor. Neste caso, são obtidos os valores em três pontos em que ocorre oposição. Tais medições prestam-se à determinação dos parâmetros da órbita para este caso.