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quarta-feira, 2 de abril de 2025

A função característica para dois osciladores harmónicos independentes

 Considere-se o sistema mecânico de uma partícula descrito pela função (ver Uma simplificação do princípio dos trabalhos virtuais aplicados à Dinâmica)

L=12m(x2+y2)12m(ω21x2+ω22y2)

Como habitual, determinam-se os momentos como

{px=Lx=mxpy=Ly=my

De acordo com o que foi apresentado em A função característica em mecânica, constrói-se a função

H=xpx+ypyL=12m(p2x+p2y)+12m(ω21x2+ω22y2)

uma vez que as componentes das velocidades se calculam, em função dos momentos, como

{x=pxmy=pym

A equação diferencial às derivadas parciais que permite determinar a equação característica V(x,y,x0,y0,tt0) é dada, portanto, por

12m((Vx)2+(Vy)2)+12(ω21x2+ω22y2)=Vt

 Observa-se que

H(x,y,x,y)=H(x,x)+H(y,y)

onde

{H(x,x)=12mp2x+12mω21x2H(y,y)=12mp2y+12mω22y2

Considera-se, portanto, a solução da equação diferencial às derivadas parciais da forma

V(x,y,x0,y0,tt0)=W1(x,x0,E1)+W2(y,y0,E2)(E1+E2)(tt0)

Como V(x,y,x0,y0,tt0) não depende explicitamente de E1 ou E2, isto é, como

VE1=VE2=0

segue-se uma das equação do movimento

W1E1=W2E2=tt0

A substituição da solução proposta na equação diferencial às derivadas parciais conduz ao sistema de equações diferenciais independentes

{12m(W1x)212mω21x2=E112m(W1y)212mω22y2=E2

A solução de cada uma das equações pode ser encontrada por simples quadratura e, portanto,

V(x,y,x0,y0,tt0)=W(x,y,x0,y0,E1,E2)(E1+E2)(tt0)

onde

W=xx02mE1m2ω21x2dx+yy02mE2m2ω22y2dx

As equações do movimento do sistema obtêm-se desta função na forma

{WE1=xx0m2mE1m2ω21x2dx=tt0WE2=yy0m2mE2m2ω22y2dx=tt0Wx=2mE1m2ω21x2=mxWy=2mE2m2ω22y2=myWx0=2mE1m2ω21x20=mx0Wy0=2mE1m2ω21y20=my0

As quatro últimas equações discriminam a conservação da energia. As duas últimas, em particular, permitem determinar E1 e E2 como função das posições e velicidades iniciais, isto é,

{E1=12mx20+12mω21x20E2=12my20+12mω22y20

A resolução da primeira equação resulta numa que pode ser colocada na forma

ω1(tt0)=arcsinmω212E1xarcsinmω212E1x0

A equação assim obtida permite determinar a dependência temporal da coordenada x. Uma forma mais simples é determinada, aplicando as funções trignonométricas a cada um dos seus membros, vindo

{cosω1(tt0)=1mω212E1x21mω212E1x20+mω212E1x0xsinω1(tt0)=1mω212E1x20mω212E1x1mω212E1x2mω212E1x0

Se se eliminar o termo

1mω212E1x2

de ambas as equações, obtém-se

mω212E1x0cosω1(tt0)+1mω212E1x20sinω1(tt0)=mω212E1x

isto é,

x=x0cosω1(tt0)+2E1mω21x20mω21sinω1(tt0)

que, atendendo à equação que permite escrever E1 como função de x0 e x0, fica

x=x0cosω1(tt0)+x0ω1sinω1(tt0)

O mesmo procedimento conduz à solução para y na forma

 y=y0cosω2(tt0)+y0ω2sinω2(tt0)

O método apresentado neste exemplo vale para qualquer sistema que seja descrito pela função H que pode ser decomposta numa soma de funções, cada uma, dependendo de um subconjunto independente de variáveis.

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025

Calor e trabalho

No artigo enlinha Consequências da primeira e segunda leis da termodinâmica para sistemas reversíveis é considerado o sistema termodinâmico constituído por um gás ideal, sobre o qual as grandezas se determinam como função de duas delas. É, por exemplo, determinado o calor transferido ou a variação da energia interna num processo isotérmico em função do volume e da pressão. Porém, o cálculo de cada uma dessas grandezas efectua-se apenas ao longo de um determinado caminho de evolução do sistema que poderá corresponder a um processo isotérmico, a um isobárico ou a um adiabático. Com efeito, a variação calcula-se só depois de se determinar uma relação entre as variáveis independentes. A energia interna difere do calor pelo simples facto da sua variação não depender do caminho de evolução do sistema. Com efeito, não importando qual é o caminho de evolução que leva do ponto estado (p0,v0) ao ponto estado (p,v), se tem sempre

ΔU=U(p,v)U(p0,v0)

independentemente do caminho de evolução. A variação do calor, por seu turno, como depende do caminho, o seu valor não poderá ser determinado do mesmo modo.

Considere-se um sistema descrito pelas duas variáveis independentes x e y onde a variação de uma quantidade dQ do ponto (x,y) para o ponto infinitamente vizinho (x+dx,y+dy) se possa escrever, até à primeira ordem,

Q(x+dx,y+dy)=Q(x,y)+pdx+qdy

ou

dQ=pdx+qdy

A variação finita da quantidade Q será dada pela soma infinita das suas variações infinitesimais ao longo de uma determinada curva. Essa variação será independente da curva se se verificar a condição

pyqx=0

pois, neste caso, poder-se-á encontrar uma função F tal que

{p=Fxq=Fy

Assim, a variação finita de Q ao longo do caminho C é dada pelo integral

I=Cpdx+qdy=CFxdx+Fydy

Se o caminho C for descrito, de um modo geral, pela parametrização

{x=x(t)y=y(t)

então

I=t1t0(Fxx+Fyy)dt=t1t0dFdtdt=F1F0

em que se fez, para abreviar,

{F0=F(x0,y0)F1=F(x1,y1)

Nesta caso particular, a variação total da quantidade Q ao longo de um caminho fechado é nula pois F1=F0. O mesmo não se verifica no caso em que

pyqx0

Pretende-se determinar a variação total da quantidade Q quando se considera um caminho fechado tão próximo do ponto (x0,y0) quanto se queira. Seja esse caminho fechado definido pelas equações paramétricas

{x=x0+εη(t)y=y0+εζ(t)

em que η(t) e ζ(t) são funções finitas, o parâmetro t varia desde t0 até t1 e ε é uma quantidade tão pequena quanto se queira. Da teoria da expansão em série de potências das funções advém a seguinte estimativa

{p(x0+εη,y0+εζ)=p(x0,y0)+ε(pxη+pyζ)+O(ε2)q(x0+εη,y0+εζ)=q(x0,y0)+ε(qxη+qyζ)+O(ε2)

A consideração do caminho especificado e da série de potências conduz ao resultado

Cpdx+qdy=εI1+ε2I2+O(ε3)

onde

{I1=t1t0(p0η+q0ζ)dt=0I2=t1t0(pxηη+pyζη+qxηζ+qyζζ)dt

O primeiro integral é nulo na medida em que η(t0)=η(t1) e ζ(t0)=ζ(t1). Por seu turno, pode-se escrever

I2=12ε2(pyqx)t2t1(ζηηζ)dt+J

Porém, e pelo mesmo motivo,

J=t1t0(pxη2+(qx+py)ηζ+qxζ2)dt=0

Segue, portanto, que

ΔQ=Cpdx+qdy=(pyqx)dA+O(ε3)

onde

dA=12ε2t2t1(ζηηζ)dt

é o elemento de área delimitado pelo caminho considerado. Observe-se que se obtém o mesmo resultado, atendendo ao conhecido teorema que proporciona

Cpdx+qdy=S(pyqx)dxdy

onde C é o caminho fechado e S é a superfície no plano delimitada pelo caminho C.

Se um sistema, ao realizar um ciclo, partindo e retornando ao mesmo estado, o excedente de calor deve ser compensado pelo excedente do trabalho realizado, do sistema no exterior e do exterior no sistema e, portanto,

Δ(QW)=0

Ora, se se fizer

{dQ=Qxdx+QydydW=Wxdx+Wydy

a equação anterior reduz-se a

UxyUyx=0

Se se fizer

dU=Uxdx+Uydy

observa-se que se trata de um diferencial total, pois a sua variação entre dois pontos estado de um sistema não depende do caminho. A primeira lei da termodinâmica assume a forma

dQ=dU+dW

Deste ponto de vista, é suficiente considerar que deve ser nulo o balanço entre o calor transferido e o trabalho realizado quando o sistema realiza um ciclo sem a necessidade de postular, à partida, a existência de uma energia interna cuja variação não depende do caminho de evolução do sistema.