quarta-feira, 1 de outubro de 2025

Teoria cinética dos gases e entropia

Considere-se um sistema de corpos completamente isolado, como é o caso, por exemplo, de um recipiente de paredes rígidas no qual uma metade é cheia com um gás que se encontra a uma determinada temperatura e pressão e a outra, com um gás que se encontra a uma temperatura e pressão maiores. Assume-se que o sistema parte de um estado inicial e, por interacção entre as suas partes, esse estado altera-se com o tempo. Além disso, assumir-se-á que o sistema irá evoluir sempre no sentido de uma situação que corresponda a um estado mais provável até que, no final de um intervalo de tempo suficientemente grande, atinja o seu estado mais provável entre todos.

Suponha-se que energia cinética \(E\) do sistema isolado se distribui pelas suas \(n\) moléculas, considerando que cada uma assuma uma energia cinética cujo valor é múltiplo de uma quantidade \(\varepsilon\). Suponha-se ainda que, após a colisão entre duas moléculas e consequente reconfiguração das suas energias cinéticas, o valor dessas novas energias continua a ser um múltiplo da quantidade \(\varepsilon\). Pretende-se, em primeiro lugar, determinar qual é o número de configurações tais que existam \(w_0\) moléculas com energia \(0\), \(w_1\) moléculas com energia \(\varepsilon\), \(w_2\) moléculas com energia \(2\varepsilon\) e assim sucessivamente até \(w_p\) moléculas com energia \(p\varepsilon\), notando que \(p\le \lambda\) dado que a energia total é também um múltiplo de \(\varepsilon\), isto é, \(E=\lambda\varepsilon\). É claro da descrição do sistema abstracto assim construído que se deve verificar o sistema de equações

\[\left\lbrace\begin{array}{l}w_0+w_1+\cdots+w_p=n\\ w_1+2w_2+\cdots +pw_p=\lambda\end{array}\right.\]

As equações descrevem o simples facto de que o número total de moléculas é considerado igual a \(n\) e a energia total do sistema igual a \(\lambda\varepsilon\). A título de exemplo, considere-se um sistema em que \(n=3\) e \(\lambda=5\). Se se denotar por \(abc\) a configuração em que a primeira molécula tem energia \(a\varepsilon\), a segunda, \(b\varepsilon\) e a terceira, \(c\varepsilon\), observa-se que as configurações possíveis são expressas na seguinte tabela.

 

ConfiguraçãoNúmero de possibilidades
5003
4106
3206
3113
2213

A primeira linha corresponde à configuração em que existe uma molécula com energia cinética \(5\varepsilon\) e duas com energia cinética \(0\), isto é, corresponde à configuração dada por \(w_0=2,\ w_5=1\) e \(w_1=w_2=w_3=w_4=0\). O número de possiblidades é três, na medida em que a energia \(5\varepsilon\) pode estar associada a cada uma das três moléculas, tendo as outras duas, uma eneriga igual a \(0\). Observando que o número total de possibilidades é \(24\), a probabilidade correspondente ao estado \(500\) é igual a \(3/24\). Não é difícil determinar que o número de possibilidades para cada configuração é dado por

\[\left(\begin{array}{c}n\\ \begin{array}{cccc}w_0 & w_1 & \cdots & w_\lambda\end{array}\end{array}\right)=\frac{n!}{w_0!w_1!\cdots w_\lambda!}\]

Uma vez que o número total de possibilidades não varia, o estado mais provável é aquele que permite maximizar a expressão anterior. Com efeito, se se denotar por \(p\) a probabilidade da combinação tem-se

\[p=\frac{\left(\begin{array}{c}n\\ \begin{array}{cccc}w_0 & w_1 & \cdots & w_\lambda\end{array}\end{array}\right)}{\binom{\lambda+n-1}{n}}\]

No exemplo, os estados mais prováveis são segundo, o terceiro e o quarto, com uma probabilidade igual a \(1/4\). Além disso, já que o número de moléculas é considerado constante, o máximo da expressão é atingido quando o denominador assume o seu menor valor possível ou, dado que a função logaritmo é monótona crescente, quando o logaritmo do denominador assume o menor valor possível, isto é, quando é menor o valor

\[P=\sum_{i=0}^\lambda{\log\left(w_i!\right)}\]

De modo a utilizar os resultados do cálculo infinitesimal na determinação do mínimo, considera-se o ajuste dos factoriais pela função gama, isto é,

\[P=\sum_{i=0}^\lambda{\log\Gamma\left(w_i+1\right)}\]

que assume os mesmos valores que a expressão anterior quando os \(w_i\) são números inteiros. A solução do problema original será, de entre as soluções próximas da que foi determinada no problema contínuo, as que proporcionam o menor valor. Pretende-se, pois, determinar o mínimo de

\[P=\sum_{i=0}^\lambda{\log\Gamma\left(w_i+1\right)}\]

sujeito às condições

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\sum_{i=0}^\lambda {w_i}=n\\ \sum_{i=0}^\lambda{iw_i}=\lambda\end{array}\right.\]

Da teoria dos multiplicadores, para determinar o mínimo da função \(P\) quando as variáveis estão sujeitas às condições dadas, consideram-se os multiplicadores \(\alpha\) e \(-\beta\) e constrói-se a função

\[F=\sum_{i=0}^\lambda{\log\Gamma\left(w_i+1\right)}+\alpha\left(n-\sum_{i=0}^\lambda {w_i}\right)-\beta\left(\lambda-\sum_{i=0}^\lambda{iw_i}\right)\]

Sabe-se que, neste caso, os extremos de \(P\) satisfazem a condição

\[\frac{\partial F}{\partial w_i}=0\]

isto é, vale o sistema das \(\lambda+1\) equações

\[\frac{d}{dw_i}\log\Gamma\left(w_i+1\right)-\alpha+i\beta=0\]

para cada valor de \(i=0,1,\cdots,\lambda\).

Observa-se que o problema é de difícil solução se se pretender recorrer à definição da função gama. No entanto, lembrando que a solução analítica encontrada vale para valores de \(w_i\) contínuos e proporcionará apenas uma aproximação da solução inteira procurada, tentar-se-á considerar um problema mais simples que proporcione soluções igualmente aproximadas. Para o efeito, observa-se que

\[\Gamma\left(w_i+1\right)=w_i\left(\log{w_i}-1\right)+\frac{1}{2}\log{2\pi}+\phi\left(w_i\right)\]

onde \(\phi\left(w_i\right)\) é da forma

\[\phi\left(w_i\right)=\frac{1}{2}\log{w_i}-\sum_{k=1}^\infty{\frac{(-1)^kB_{k+1}}{k(k+1)w_i^k}}\]

em que os \(B_k\) são determinados números finitos. Observa-se que, para valores muito elevados de \(w_i\), se tem

\[\frac{d\phi}{dw_i}\approx 0\]

As condições que devem ser observadas nos extremos advêm da forma

\[\frac{d}{dw_i}\left(w_i\log{w_i}\right)-(\alpha+1)+\beta i=0\]

que são as equações que se obtêm, ao tentar determinar os extremos da função

\[S=\sum_{i=0}^{\lambda}{w_i\log{w_i}}\]

sujeita às condições consideradas. A solução das equações correspondentes às condições é dada por

\[w_i=e^\alpha e^{-\beta i}\]

 A substituição na primeira equação das condições permite obter

\[e^\alpha=\frac{n}{\sum_{j=0}^\lambda{e^{-\beta j}}}\]

Note-se que, se se considerar que \(\lambda\to\infty\), o que corresponde a uma aproximação real quando se considera um número cada vez maior de valores possível para a energia, tem-se

\[e^\alpha=n\left(1-e^{-\beta}\right)\]

e, portanto,

\[\frac{w_i}{n}=\left(1-e^{-\beta}\right)e^{-\beta i}\]

Por outro lado, como

\[\sum_{i=0}^\infty{ie^{-\beta i}}=-\frac{d}{d\beta}\sum_{i=0}^{\infty}{e^{-\beta i}}=-\frac{d}{d\beta}\left(\frac{1}{1-e^{-\beta}}\right)=\frac{e^{-\beta}}{\left(1-e^{-\beta}\right)^2}\]

segue-se, substituindo \(w_i/n\) na segunda condição,

\[e^{-\beta}=\frac{\frac{\lambda}{n}}{1+\frac{\lambda}{n}}\]

e, portanto, tem-se a solução aproximada para o extremo na forma

\[\frac{w_i}{n}=\frac{1}{1+\frac{\lambda}{n}}\left(\frac{\frac{\lambda}{n}}{1+\frac{\lambda}{n}}\right)^i\]

É interessante averiguar até que ponto é boa a aproximação dada por esta última expressão ao caso de valores de \(n\) e \(\lambda\) suficientemente elevados. Não será aqui apresentado qualquer exemplo numérico. No entanto, no caso contínuo, considera-se que a quantidade \(w_i/n\) correponde à probabilidade de, escolhida uma partícula ao acaso, esta ter uma energia igual a \(E_i=\varepsilon i\) e, define-se, portanto, \(\rho(E)\) como a distribuição dessa probabilidade em função da energia. Neste sentido, designando por \(\rho_i=\rho\left(E_i\right)\), a quantidade \(\rho_i dE\) proporciona a probabilidade de que, escolhida uma partícula ao acaso, a sua energia estará compreendida entre \(E_i\) e \(E_i+dE\). Note-se que esse valor é dado por \(w_i/n\) em que \(w_i\) é o número de partículas cujo valor da energia se encontra nesse mesmo intervalo.

O mesmo argumento usado anteriormente vale aqui, notando que as condições são agora dadas por

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\sum_{i=0}^{r}{\rho_i dE}=1\\ \sum_{i=0}^r{E_i\rho_i dE}=\bar{E}\end{array}\right.\]

O valor de \(r\) é o número de partições que se considera sobre a eneriga e \(\bar{E}\) é a energia média por partícula, suposta finita. A função a minimizar será, portanto

\[S=\sum_{i=0}^{r}{\rho_i dE\log{\rho_i}}+\log{dE}\sum_{i=0}^{r}{\rho_i dE}=\sum_{i=0}^{r}{\rho_i dE\log{\rho_i}}+\log{dE}\]

No caso limite em que os intervalos de partição são cada vez menores e \(r\to\infty\), o problema reduz-se à minimização de

\[\int_0^\infty{\rho(E)\log\rho(E) dE}\]

sujeito às condições

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\int_0^\infty{\rho(E)dE}=1\\ \int_{0}^\infty{E\rho(E)dE}=\bar{E}\end{array}\right.\]

já que \(\log dE\) é uma constante no processo de minimização. 

Recorrendo, mais uma vez, à teoria dos multiplicadores em cálculo variacional, a solução procurada é tal que seja nula a variação dos seguinte funcional integral

\[\delta\int_0^\infty{\left\lbrack\rho(E)\log\rho(E)+\alpha\rho(E)+\beta E\rho(E)\right\rbrack dE}=0\]

Após determinar a variação, obtém-se a solução

\[\rho(E)=Ae^{-\beta E}\]

Para que a primeira equação seja satisfeita, tem-se

\[\rho(E)=\frac{e^{-\beta E}}{\int_0^\infty e^{-\beta E}dE}=\frac{e^{-\beta E}}{\beta}\]

Da segunda equação segue-se que

\[\beta=\frac{1}{\sqrt{\bar{E}}}\]

e a distribuição final advém da forma

\[\rho(E)=\frac{1}{\sqrt{\bar{E}}}e^{-\frac{E}{\sqrt{\bar{E}}}}\]

Considere-se o caso em que, ao invés de se considerarem as energias das moléculas, são consideradas as componentes tridimensionais das suas velocidades. Se se denotar por \(w_\vec{v}\) o número de moléculas que tem a velocidade dada pelo vector \(\vec{v}\), então o número de configurações será dado por

\[\frac{n!}{\prod_\vec{v}{w_\vec{v}}!}\]

Definindo \(\rho\left(\vec{v}\right)\) como a distribuição de probabilidades e considerando que se pretende a energia cinética média constante e igual a \(\bar{E}\), o raciocínio atrás apresentado permite concluir que a distribuição do equilíbrio é aquela que minimiza o integral triplo

\[\int_{-\infty}^{+\infty}\int_{-\infty}^{+\infty}\int_{-\infty}^{+\infty}\rho\left(v_x,v_y,v_z\right)\log\rho\left(v_x,v_y,v_z\right)dv_xdv_ydv_z\]

sujeita às condições

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\int_{-\infty}^{+\infty}\int_{-\infty}^{+\infty}\int_{-\infty}^{+\infty}\rho\left(v_x,v_y,v_z\right)dv_xdv_ydv_z=1\\ \frac{1}{2m}\int_{-\infty}^{+\infty}\int_{-\infty}^{+\infty}\int_{-\infty}^{+\infty}\left(v_x^2+v_y^2+v_z^2\right)\rho\left(v_x,v_y,v_z\right)dv_xdv_ydv_z=\bar{E}\end{array}\right.\]

Para fazer essa determinação, calcula-se

\[\delta \int_{-\infty}^{+\infty}\int_{-\infty}^{+\infty}\int_{-\infty}^{+\infty}\left\lbrack\rho\log\rho -\alpha\rho-\beta\left(v_x^2+v_y^2+v_z^2\right)\rho\right\rbrack dv_xdv_ydv_z=0\]

A respectiva variação conduz à solução

\[\rho\left(v_x,v_y,v_Z\right)=Ae^{-\beta\left(v_x^2+v_y^2+v_z^2\right)}\]

Da primeira restrição segue-se que

\[\rho\left(v_x,v_y,v_z\right)=\frac{e^{-\beta\left(v_x^2+v_y^2+v_z^2\right)}}{\int\int\int{e^{-\beta\left(v_x^2+v_y^2+v_z^2\right)} dv_xdv_ydv_z}}=\left(\frac{\beta}{2\pi}\right)^{\frac{3}{2}}e^{-\beta\left(v_x^2+v_y^2+v_z^2\right)}\]

uma vez que

\[\int_{-\infty}^{+\infty}\int_{-\infty}^{+\infty}\int_{-\infty}^{+\infty}{e^{-\beta\left(v_x^2+v_y^2+v_z^2\right)}dv_xdv_ydv_z}=\left(\frac{2\pi}{\beta}\right)^{\frac{3}{2}}\]

Por outro lado, como

\[\int_{-\infty}^{+\infty}\int_{-\infty}^{+\infty}\int_{-\infty}^{+\infty}{\left(v_x^2+v_y^2+v_z^2\right)e^{-\beta\left(v_x^2+v_y^2+v_z^2\right)}dv_xdv_ydv_z}=    \frac{d}{d\beta}\left(\frac{2\pi}{\beta}\right)^{\frac{3}{2}}=\frac{3\left(2\pi\right)^{\frac{3}{2}}}{2\beta^{\frac{5}{2}}}\]

a segunda condição permite obter \(\beta\) e, portanto,

\[\rho\left(v_x,v_y,v_z\right)=\left(\frac{3m}{8\pi\bar{E}}\right)^{\frac{3}{2}}e^{-\frac{3m}{4\bar{E}}\left(v_x^2+v_y^2+v_z^2\right)}\]

Convém notar que o sistema deve ser descrito, não só pelas velocidades, mas também pelas posições. Com efeito, foi atrás considerado, no processo de minimização, que o número total de estados não varia com o tempo. Isso é verdade na medida em que, de acordo com um teorema conhecido de mecânica, se \(V_1\) for um volume considerado no espaço de fase que se mapeia, ao fim de um tempo \(t\) num volume \(V_2\) através do movimento das suas partes, então \(V_1\) e \(V_2\) serão iguais em magnitude. Neste sentido, ao invés de se considerarem apenas as velocidades, seria pertinente prestar atenção às posições e aos momentos e estes, no caso apresentado, são proporiconais às velocidades. Pouco há a acrescentar no que concerne às posições. As função a mininimizar e as condições são as mesmas com a pequena excepção de que as integrais, ao invés de serem triplas e se estenderem apenas sobre o domínio das velocidades, são sextuplas e estendem-se ao domínio das posições consideradas sobre o volume total do sistema, e das velocidades. Neste caso,

\[\rho\left(x,y,z,v_x,v_y,v_z\right)=\frac{1}{V}\left(\frac{3m}{8\pi\bar{E}}\right)^{\frac{3}{2}}e^{-\frac{3m}{4\bar{E}}\left(v_x^2+v_y^2+v_z^2\right)}\]

onde \(V\) é esse volume. De acordo com o que foi estabelecido, o número total de estados associados à configuração de equilíbrio é dado por

\[f\left(x,y,z,v_x,v_y,v_z\right)=N\rho\left(x,y,z,v_x,v_y,v_z\right)=\frac{N}{V}\left(\frac{3m}{8\pi\bar{E}}\right)^{\frac{3}{2}}e^{-\frac{3m}{4\bar{E}}\left(v_x^2+v_y^2+v_z^2\right)}\]

Ora, se se substituir a função anterior na expressão

\[\Omega=-\int f\left(x,y,z,v_x,v_y,v_z\right)\log f\left(x,y,z,v_x,v_y,v_z\right) dxdydzdv_xdv_ydv_z\]

obtém-se

\[\Omega=-N\log N+N\log V\left(\frac{8\pi\bar{E}}{3m}\right)^{\frac{3}{2}}+\frac{3}{2}N\]

isto é,

\[\Omega = N\log\left( V\bar{E}^{\frac{3}{2}}\right)+C\]

Por seu turno, como pode ser visto na posta Consequências da primeira e segunda leis da termodinâmica, a entropia associada a um gás ideal é dada por

\[S=\log T^{C_v}V^R+C\]

Observa-se, portanto, que \(\Omega\) deve ser proporcional à entropia se \(\bar{E}\), a energia cinética média for, de algum modo, identificada com a temperatura do sistema. 

terça-feira, 12 de agosto de 2025

Transformação de coordenadas nas equações do electromagnetismo

 Na posta enlinha Uma visão alternativa da transformação que deixa invariante as equações do electromagnetismo considerei as equações electromagnéticas em termos do produto exterior de um operador diferencial por duas formas relacionadas entre si para analisar a transformação linear que as deixa invariante. Esses produtos exteriores, por seu turno, correspondem às derivadas exteriores das formas referidas. No texto Os operadores diferenciais associados à derivada exterior em coordenadas generalizadas apresentei o modo como essas equações se transformam consoante a transformação de coordenadas, o que desenvolverei aqui.

As equações do electromagnetismo escrevem-se como

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\frac{\partial F_{12}}{\partial x^3}-\frac{\partial F_{13}}{\partial x^2}+\frac{\partial F_{23}}{\partial x^1}=0\\ \frac{F_{12}}{\partial x^4}-\frac{\partial F_{14}}{\partial x^2}+\frac{\partial F_{24}}{\partial x^1}=0\\ \frac{F_{13}}{\partial x^4}-\frac{\partial F_{14}}{\partial x^3}+\frac{\partial F_{34}}{\partial x^1}=0\\ \frac{F_{23}}{\partial x^4}-\frac{\partial F_{24}}{\partial x^3}+\frac{\partial F_{34}}{\partial x^2}=0\\ \frac{G^{12}}{\partial x^3}-\frac{\partial G^{13}}{\partial x^2}+\frac{\partial G^{14}}{\partial x^1}=\rho=-J^4\\ \frac{G^{12}}{\partial x^4}-\frac{\partial G^{14}}{\partial x^2}+\frac{\partial G^{24}}{\partial x^1}=-J^3\\ \frac{G^{13}}{\partial x^4}-\frac{\partial G^{14}}{\partial x^3}+\frac{\partial G^{34}}{\partial x^1}=-J^2\\ \frac{G^{23}}{\partial x^4}-\frac{\partial G^{24}}{\partial x^3}+\frac{\partial G^{34}}{\partial x^2}=-J^1\end{array}\right.\]

em que \(x^1\), \(x^2\) e \(x^3\) são as coordenadas rectangulares espaciais e \(x^4\) é o tempo \(t\) e

\[G^\alpha=\sum_{\beta\in I_2(\left\lbrace 1,2,3,4\right\rbrace)}{A^{\alpha\beta} F_\beta}\] 

Em termos dos campos eléctrico e magnético, tem-se

\[\left\lbrace\begin{array}{llllll}F_{12}=B^3 & F_{13}=-B^2 & F_{23}=B^1 & F_{14}=E^1 & F_{24}=E^2 & F_{34}=E^3\\ G^{12}=D^3 & G^{13}=-D^2 & G^{23}=D^1 & G^{14}=-H^1 & G^{24}=H^2 & G^{34}=-H^3 \end{array}\right.\]

Com efeito, a substituição no sistema de equações diferenciais conduz às conhecidas equações. Sejam as transformações de coordenadas definidas por

\[dx^i=\sum_{j=1}^4{p_j^i d\theta^j}\]

 em que

\[p^i_j=\frac{\partial\ x^i}{\partial\theta^j}\]

Os coeficientes da transformação inversa são dados por

\[q^i_j=\frac{\partial \theta^i}{\partial x^j}\]

Dado que os \(F_{\left\lbrace i,j\right\rbrace}\) são componentes de uma \(2-\)forma, então transformam-se como

\[F'_{\left\lbrace i,j\right\rbrace}=\sum_{\alpha\in I_2\left(\left\lbrace 1,2,3,4\right\rbrace\right)}{p_{\left\lbrace i,j\right\rbrace}^\alpha F_\alpha}\]

em que

\[p_{\left\lbrace i,j\right\rbrace}^{\left\lbrace k,l\right\rbrace}=\left\vert\begin{array}{cc}p_i^k & p_i^l\\ p_j^k & p_j^l\end{array}\right\vert\]

Do mesmo modo,

\[\left\lbrace\begin{array}{l}G'^\alpha=\sum_{\beta\in I_2\left(\left\lbrace 1,2,3,4\right\rbrace\right)}{p^\alpha_\beta G^\beta}\\ A'^{\alpha\beta}=\sum_{\gamma,\eta\in I_2\left(\left\lbrace 1,2,3,4\right\rbrace\right)}{q_\gamma^\alpha q_\eta^\beta A^{\gamma\eta}}\\ J' ^i=\sum_{j=1}^4{q_j^iJ^j}\end{array}\right.\]

e as equações diferenciais irão admitir a forma

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\frac{\partial F'_{12}}{\partial  \theta^3}-\frac{\partial F'_{13}}{\partial \theta^2}+\frac{\partial F'_{23}}{\partial \theta^1}=0\\ \frac{F'_{12}}{\partial \theta^4}-\frac{\partial F'_{14}}{\partial \theta^2}+\frac{\partial F'_{24}}{\partial \theta^1}=0\\ \frac{F'_{13}}{\partial \theta^4}-\frac{\partial F'_{14}}{\partial \theta^3}+\frac{\partial F'_{34}}{\partial \theta^1}=0\\ \frac{F'_{23}}{\partial \theta^4}-\frac{\partial F_{24}}{\partial \theta^3}+\frac{\partial F'_{34}}{\partial \theta^2}=0\\ \frac{G'^{12}}{\partial \theta^3}-\frac{\partial G'^{13}}{\partial \theta^2}+\frac{\partial G'^{14}}{\partial \theta^1}=\rho'=-J'^4\\ \frac{G'^{12}}{\partial \theta^4}-\frac{\partial G'^{14}}{\partial \theta^2}+\frac{\partial G'^{24}}{\partial \theta^1}=-J'^3\\ \frac{G'^{13}}{\partial \theta^4}-\frac{\partial G'^{14}}{\partial \theta^3}+\frac{\partial G'^{34}}{\partial \theta^1}=-J'^2\\ \frac{G'^{23}}{\partial \theta^4}-\frac{\partial G'^{24}}{\partial \theta^3}+\frac{\partial G'^{34}}{\partial \theta^2}=-J'^1\end{array}\right.\]

Se se tratarem de equações no vazio, então, nas coordenadas rectangulares, tem-se

\[\left\lbrack A^{\alpha\beta}\right\rbrack=\left\lbrack\begin{array}{cccccc}0 &0 &0 &0 & 0 & \varepsilon\\ 0 & 0 & 0 & 0 & -\varepsilon & 0\\ 0 & 0 & 0 & -\frac{1}{\mu} & 0 & 0\\ 0 & 0 & \varepsilon & 0 & 0 & 0\\ 0 & \frac{1}{\mu} & 0 & 0 & 0 & 0\\ \frac{1}{\mu} & 0 & 0 & 0 & 0 & 0\end{array}\right\rbrack\]

 A matriz divide-se em dois blocos, nomeadamente,

\[\left\lbrace\begin{array}{l}A^{\alpha\ N-\beta}=(-1)^{|\alpha|+1}\varepsilon\delta^{\alpha\beta}\\ A^{N-\alpha\ N-\beta}=(-1)^{|\alpha|}\frac{1}{\mu}\delta^{N-\alpha\ \beta}\end{array}\right.\]

onde \(\alpha\in I_2\left(\left\lbrace 1,2,3\right\rbrace\right)\). A lei da transformação de coordenadas permite obter

\[A'^{\alpha\ N-\beta}=\sum_{\gamma,\eta\in I_2\left(\left\lbrace 1,2,3,4\right\rbrace\right)}{q_\gamma^\alpha q_{N-\eta}^{N-\beta}A^{\gamma\ N-\eta}}=\varepsilon\sum_{\gamma,\eta\in I_2\left(\left\lbrace 1,2,3\right\rbrace\right)}{(-1)^{|\gamma|+1}q_\gamma^\alpha q_{N-\eta}^{N-\beta}\delta^{\gamma\eta}}\]

Da teoria da expansão dos determinantes sabe-se que

\[q_{N-\eta}^{N-\beta}=\frac{1}{|P|}(-1)^{|\eta|+|\beta|}p_\beta^\eta\]

onde \(|P|\) é o determinante da matriz \(\left\lbrack p_i^j\right\rbrack\) e, portanto,

\[A'^{\alpha\ N-\beta}=(-1)^{|\beta|+1}\frac{\varepsilon}{|P|}\sum_{\gamma\in I_2\left(\left\lbrace 1,2,3\right\rbrace\right)}{q_\gamma^\alpha p_\beta^\gamma}\]

Do mesmo modo,

\[A'^{N-\alpha\ N-\beta}=\frac{(-1)^{|\beta|}}{\mu |P|}\sum_{\gamma\in I_2\left(\left\lbrace 1,2,3\right\rbrace\right)}{q_\gamma^{N-\alpha} p_\beta^\gamma}\]

Suponha-se que as transformações não involvem o tempo, isto é, são da forma

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x^1=x^1\left(\theta^1,\theta^2,\theta^3\right)\\ x^2=x^2\left(\theta^1,\theta^2,\theta^3\right)\\ x^3=x^3\left(\theta^1,\theta^2,\theta^3\right)\\ x^4=t\end{array}\right.\]

Neste caso, as transformações das \(2-\)formas, \(p_\alpha^\beta\), também são dadas por uma matriz em bloco e

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\sum_{\gamma\in I_2\left(\left\lbrace 1,2,3\right\rbrace\right)}{q_\gamma^\alpha p_\beta^\gamma}=\delta^\alpha_\beta\\ \sum_{\gamma\in I_2\left(\left\lbrace 1,2,3\right\rbrace\right)}{q_\gamma^{N-\alpha} p_\beta^\gamma}=\delta_\beta^{N-\alpha}\end{array}\right.\]

Segue-se daqui que

\[A'^{\alpha\beta}=\frac{1}{|P|}A^{\alpha\beta}\]

e as equações no vazio escrevem-se como

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\vec{\nabla}\cdot\frac{\vec{E}}{|P|}=0\\ \vec{\nabla}\cdot\vec{B}=0\\ \vec{\nabla}\times\vec{E}+\frac{\partial \vec{B}}{\partial t}=0\\ \vec{\nabla}\times{\frac{\vec{B}}{\mu |P|}}-\frac{\partial}{\partial t}\left(\frac{\varepsilon\vec{E}}{|P|}\right)=0\end{array}\right.\] 

notando que as componentes de \(\vec{E}\) e \(\vec{B}\) devem ser obtidas por intermédio da lei de transformação supracitada.

O caso em que as transformações envolvem o tempo é mais complicado, na medida em que será alterada a forma da matriz \(A^{\alpha\beta}\). 

terça-feira, 3 de junho de 2025

Problema de uma partícula que se move em torno de um campo gravítico central

 No texto enlinha Invariantes nas equações do movimento foi observado que o problema geral de uma partícula que se move em torno de um campo gravítico central, cujas soluções dependem de seis condições iniciais, se reduz a um problema mais simples se se considerar uma configuração particular das condições iniciais, obtendo as demais soluções por simples rotação. Suponha-se que \(x\), \(y\) e \(z\) são dados, em coordenadas esféricas, por

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x=r\sin\phi\cos\theta\\ y=r\sin\phi\sin\theta\\z=r\cos\phi\end{array}\right.\]

Nestas coordenadas determina-se

\[\left\lbrace\begin{array}{l}l_1=y'z-z'y=r^2\phi'\sin\theta+r^2\theta'\sin\phi\cos\phi\cos\theta\\ l_2=z'x-x'z=-r^2\phi'\cos\theta+r^2\theta'\sin\phi\cos\phi\sin\theta\\l_3=x'y-y'x=-r^2\theta'\sin^2\phi\end{array}\right.\]

Observa-se que as soluções que satisfazem

\[\phi=\frac{\pi}{2}\]

se existirem, são tais que \(l_1=l_2=0\) e \(l_3=-r^2\theta'\), pois \(\phi'=0\). A função \(L\), neste caso, fica da forma

\[L=\frac{1}{2}m\left(r'^2+r^2\theta'^2\right)+\frac{GMm}{r}\]

onde se considera o caso clássico em que a intensidade da força é proporcional ao quadrado da distância ao seu centro,

\[U(r)=\frac{GMm}{r}\]

 Segue-se que

\[\left\lbrace\begin{array}{l}p_r=\frac{\partial L}{\partial r'}=mr'\\ p_\theta=\frac{\partial L}{\partial \theta'}=mr^2\theta'\end{array}\right.\]

e

\[H=\frac{1}{2m}\left(p_r^2+\frac{1}{r^2}p_\theta^2\right)-\frac{GMm}{r}\]

Procedendo de um modo semelhante ao apresentado enlinha na ligação A função característica para dois osciladores harmónicos independentes, considera-se a equação diferencial às derivadas parciais para \(W\) na forma

\[\frac{1}{2m}\left(\left(\frac{\partial W}{\partial r}\right)^2+\frac{1}{r^2}\left(\frac{\partial W}{\partial\theta}\right)^2\right)-\frac{GMm}{r}-E=0\]

ou

\[\frac{r^2}{2m}\left(\frac{\partial W}{\partial r}\right)^2-GMmr-Er^2+\frac{1}{2m}\left(\frac{\partial W}{\partial\theta}\right)^2=0\]

 Ora, considerando que \(W(r,\theta)=W_r(r)+W_\theta(\theta)\), obtém-se

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\frac{r^2}{2m}\left(\frac{dW_r}{dr}\right)^2-GMmr-Er^2+\frac{l^2}{2m}=0\\ \frac{dW_\theta}{d\theta}=l\end{array}\right.\]

e, portanto,

\[W=l\left(\theta-\theta_0\right)+\int_{r_0}^r{\sqrt{\frac{2GMm^2}{r}+2mE-\frac{l^2}{r^2}}dr}\]

isto é,

\[V=l\left(\theta-\theta_0\right)+\int_{r_0}^r{\sqrt{\frac{2GMm^2}{r}+2mE-\frac{l^2}{r^2}}dr}-E\left(t-t_0\right)\]

Dado que \(V\) não depende explicitamente de \(E\) e \(l\), então

\[\frac{\partial V}{\partial l}=\frac{\partial V}{\partial E}=0\]

de onde se extraem as equações

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\theta-\theta_0=\int_{r_0}^r{\frac{l}{r^2\sqrt{\frac{2GMm^2}{r}+2mE-\frac{l^2}{r^2}}}dr}\\ t-t_0=\int_{r_0}^r{\frac{m}{\sqrt{\frac{2GMm^2}{r}+2mE-\frac{l^2}{r^2}}}dr}\end{array}\right.\] 

Torna-se claro que a primeira equação provê a órbita da partícula, proporcionando \(r\) em função do ângulo \(\theta\). A substituição

\[r\to\frac{1}{u}\]

permite escrever

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\theta-\theta_0=-\int_{u_0}^u{\frac{l}{\sqrt{2GMm^2u+2mE-l^2u^2}}du}\\ t-t_0=\int_{u_0}^u{\frac{m}{u^2\sqrt{2GMm^2u+2mE-l^2u^2}}du}\end{array}\right.\]

A solução do primeiro integral é dada por

\[\theta-\theta_0=\arcsin\left(\frac{u_0-\frac{GMm^2}{l^2}}{\sqrt{\frac{2mE}{l^2}+\left(\frac{GMm^2}{l^2}\right)^2}}\right)-\arcsin\left(\frac{u-\frac{GMm^2}{l^2}}{\sqrt{\frac{2mE}{l^2}+\left(\frac{GMm^2}{l^2}\right)^2}}\right)\]

Ora, se se fizer

\[\tau=\arcsin x-\arcsin y\]

isto é,

\[\arcsin y=\tau-\arcsin x\]

então

\[y=-x\cos\tau+\sqrt{1-x^2}\sin\tau\]

que, aplicada à solução encontrada, permite escrevê-la como

\[u-\frac{GMm^2}{l^2}=\left(u_0-\frac{GMm^2}{l^2}\right)\cos\tau-\sqrt{\frac{2mE}{l^2}-u_0^2+\frac{2GMm^2}{l^2}u_0}\sin\tau\]

em que \(\tau=\theta-\theta_0\). Em termos de \(r\) e \(r_0\) tem-se a equação da órbita na forma

\[r=\frac{1}{\frac{GMm^2}{l^2}+\left(\frac{1}{r_0}-\frac{GMm^2}{l^2}\right)\cos\left(\theta-\theta_0\right)-\frac{1}{l}\sqrt{2mE-\frac{l^2}{r_0^2}+\frac{2GMm^2}{r_0}}\sin\left(\theta-\theta_0\right)}\]

 Das equações do movimento associadas à função característica \(V\) obtem-se

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\frac{\partial V}{\partial r_0}=-\left\lbrack\frac{\partial L}{\partial r'}\right\rbrack_{t=t_0}\\ \frac{\partial V}{\partial \theta_0}=-\left\lbrack\frac{\partial L}{\partial \theta'}\right\rbrack_{t=t_0}\end{array}\right.\]

que proporcionam o valor de \(E\) e \(l\) em termos dos valores associados às condições iniciais, nomeadamente,

\[\left\lbrace\begin{array}{l}E=\frac{1}{2}m{r'}_0^2+\frac{l^2}{2mr_0^2}-\frac{GmM}{r_0}\\ l=mr_0^2\theta'_0\end{array}\right.\]

e que permitem reescrever a equação da órbita como

\[r=\frac{\left(r_0^2\theta'_0\right)^2}{GM+\left(r_0^3{\theta'}_0^2-GM\right)\cos\left(\theta-\theta_0\right)-r_0^2\theta'_0r'_0\sin\left(\theta-\theta_0\right)}\]

Se se fizer

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\cos\eta=\frac{r_0^3{\theta'}_0^2-GM}{\sqrt{\left(r_0^3{\theta'}_0^2-GM\right)^2+\left(r_0^2\theta'_0r'_0\right)^2}}\\ \sin\eta=\frac{r_0^2\theta'_0r'_0}{\sqrt{\left(r_0^3{\theta'}_0^2-GM\right)^2+\left(r_0^2\theta'_0r'_0\right)^2}}\end{array}\right.\]

a equação da órbita pode ser escrita na forma

\[r=\frac{A}{B+C\cos\tau}\]

onde se fez, para abreviar,

\[\left\lbrace\begin{array}{l}A=r_0^2\theta'_0\\ B=GM\\ C=\sqrt{\left(r_0^3{\theta'}_0^2-GM\right)^2+\left(r_0^2\theta'_0r'_0\right)^2}\\ \tau=\theta-\theta_0+\eta\end{array}\right.\]

Trata-se da equação de uma elipse se \(B>C\), da parábola, se \(B=C\) e da hipérbole, caso \(B<C\). No caso da elipse o semi-eixo das abcissas será dado por

\[a=\frac{AB}{B^2-C^2}\]

e, no da hipérbole, por

\[a=\frac{AB}{B^2+C^2}\]

O segundo integral, nomeadamente,

 \[t-t_0=\int_{r_0}^r{\frac{m}{\sqrt{\frac{2GMm^2}{r}+2mE-\frac{l^2}{r^2}}}dr}\]

permite determinar a dependência temporal de \(r\) mas é muito mais trabalhoso. No entanto, da equação

\[\frac{\partial V}{\partial \theta}=\frac{\partial L}{\partial\theta'}\]

obtém-se a equação diferencial seperável

\[mr^2\theta'=l\]

cuja solução para \(\theta\) se escreve como

\[\frac{l}{m}\left(t-t_0\right)=\int_{\theta_0}^\theta{\frac{A^2}{\left(B+C\cos\left(\theta-\theta_0+\eta\right)\right)^2}d\theta}\]

Dado que o integral representa o dobro área da secção da órbita definida pelo raio vector com origem no foco quando roda desde o ângulo \(\theta_0\) até ao ângulo \(\theta\), osberva-se que, com efeito, essa área aumenta linearmente com o tempo.  

quarta-feira, 2 de abril de 2025

A função característica para dois osciladores harmónicos independentes

 Considere-se o sistema mecânico de uma partícula descrito pela função (ver Uma simplificação do princípio dos trabalhos virtuais aplicados à Dinâmica)

\[L=\frac{1}{2}m\left(x'^2+y'^2\right)-\frac{1}{2}m\left(\omega_1^2x^2+\omega_2^2y^2\right)\]

Como habitual, determinam-se os momentos como

\[\left\lbrace\begin{array}{l}p_x=\frac{\partial L}{\partial x'}=mx'\\ p_y=\frac{\partial L}{\partial y'}=my'\end{array}\right.\]

De acordo com o que foi apresentado em A função característica em mecânica, constrói-se a função

\[H=x'p_x+y'p_y-L=\frac{1}{2m}\left(p_x^2+p_y^2\right)+\frac{1}{2}m\left(\omega_1^2x^2+\omega_2^2y^2\right)\]

uma vez que as componentes das velocidades se calculam, em função dos momentos, como

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x'=\frac{p_x}{m}\\ y'=\frac{p_y}{m}\end{array}\right.\]

A equação diferencial às derivadas parciais que permite determinar a equação característica \(V\left(x,y,x_0,y_0,t-t_0\right)\) é dada, portanto, por

\[\frac{1}{2m}\left(\left(\frac{\partial V}{\partial x}\right)^2+\left(\frac{\partial V}{\partial y}\right)^2\right)+\frac{1}{2}\left(\omega_1^2x^2+\omega_2^2y^2\right)=-\frac{\partial V}{\partial t}\]

 Observa-se que

\[H\left(x,y,x',y'\right)=H\left(x,x'\right)+H\left(y,y'\right)\]

onde

\[\left\lbrace\begin{array}{l} H\left(x,x'\right)=\frac{1}{2m}p_x^2+\frac{1}{2}m\omega_1^2 x^2\\ H\left(y,y'\right)=\frac{1}{2m}p_y^2+\frac{1}{2}m\omega_2^2 y^2\end{array}\right.\]

Considera-se, portanto, a solução da equação diferencial às derivadas parciais da forma

\[V\left(x,y,x_0,y_0,t-t_0\right)=W_1\left(x,x_0,E_1\right)+W_2\left(y,y_0,E_2\right)-\left(E_1+E_2\right)\left(t-t_0\right)\]

Como \(V\left(x,y,x_0,y_0,t-t_0\right)\) não depende explicitamente de \(E_1\) ou \(E_2\), isto é, como

\[\frac{\partial V}{\partial E_1}=\frac{\partial V}{\partial E_2}=0\]

segue-se uma das equação do movimento

\[\frac{\partial W_1}{\partial E_1}=\frac{\partial W_2}{\partial E_2}=t-t_0\]

A substituição da solução proposta na equação diferencial às derivadas parciais conduz ao sistema de equações diferenciais independentes

\[\left\lbrace\begin{array}{l} \frac{1}{2m}\left(\frac{\partial W_1}{\partial x}\right)^2-\frac{1}{2}m\omega_1^2 x^2=E_1\\ \frac{1}{2m}\left(\frac{\partial W_1}{\partial y}\right)^2-\frac{1}{2}m\omega_2^2 y^2=E_2\end{array}\right.\]

A solução de cada uma das equações pode ser encontrada por simples quadratura e, portanto,

\[V\left(x,y,x_0,y_0,t-t_0\right)=W\left(x,y,x_0,y_0,E_1,E_2\right)-\left(E_1+E_2\right)\left(t-t_0\right)\]

onde

\[W=\int_{x_0}^x{\sqrt{2mE_1-m^2\omega_1^2 x^2}dx}+\int_{y_0}^y{\sqrt{2mE_2-m^2\omega_2^2 y^2}dx}\]

As equações do movimento do sistema obtêm-se desta função na forma

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\frac{\partial W}{\partial E_1}=\int_{x_0}^x{\frac{m}{\sqrt{2mE_1-m^2\omega_1^2x^2}}dx}=t-t_0\\ \frac{\partial W}{\partial E_2}=\int_{y_0}^y{\frac{m}{\sqrt{2mE_2-m^2\omega_2^2y^2}}dx}=t-t_0\\ \frac{\partial W}{\partial x}=\sqrt{2mE_1-m^2\omega_1^2x^2}=mx'\\ \frac{\partial W}{\partial y}=\sqrt{2mE_2-m^2\omega_2^2y^2}=my'\\ \frac{\partial W}{\partial x_0}=\sqrt{2mE_1-m^2\omega_1^2x_0^2}=mx_0'\\ \frac{\partial W}{\partial y_0}=\sqrt{2mE_1-m^2\omega_1^2y_0^2}=my_0'\end{array}\right.\]

As quatro últimas equações discriminam a conservação da energia. As duas últimas, em particular, permitem determinar \(E_1\) e \(E_2\) como função das posições e velicidades iniciais, isto é,

\[\left\lbrace\begin{array}{l}E_1=\frac{1}{2}mx_0'^2+\frac{1}{2}m\omega_1^2x_0^2\\ E_2=\frac{1}{2}my_0'^2+\frac{1}{2}m\omega_2^2y_0^2\end{array}\right.\]

A resolução da primeira equação resulta numa que pode ser colocada na forma

\[\omega_1\left(t-t_0\right)=\arcsin\sqrt{\frac{m\omega_1^2}{2E_1}}x-\arcsin\sqrt{\frac{m\omega_1^2}{2E_1}}x_0\]

A equação assim obtida permite determinar a dependência temporal da coordenada \(x\). Uma forma mais simples é determinada, aplicando as funções trignonométricas a cada um dos seus membros, vindo

\[\left\lbrace\begin{array}{l}\cos\omega_1\left(t-t_0\right)=\sqrt{1-\frac{m\omega_1^2}{2E_1}x^2}\sqrt{1-\frac{m\omega_1^2}{2E_1}x_0^2}+\frac{m\omega_1^2}{2E_1}x_0x\\ \sin\omega_1\left(t-t_0\right)=\sqrt{1-\frac{m\omega_1^2}{2E_1}x_0^2}\sqrt{\frac{m\omega_1^2}{2E_1}}x-\sqrt{1-\frac{m\omega_1^2}{2E_1}x^2}\sqrt{\frac{m\omega_1^2}{2E_1}}x_0\end{array}\right.\]

Se se eliminar o termo

\[\sqrt{1-\frac{m\omega_1^2}{2E_1}x^2}\]

de ambas as equações, obtém-se

\[\sqrt{\frac{m\omega_1^2}{2E_1}}x_0\cos\omega_1\left(t-t_0\right)+\sqrt{1-\frac{m\omega_1^2}{2E_1}x_0^2}\sin\omega_1\left(t-t_0\right)=\sqrt{\frac{m\omega_1^2}{2E_1}}x\]

isto é,

\[x=x_0\cos\omega_1\left(t-t_0\right)+\sqrt{\frac{2E_1-m\omega_1^2x_0^2}{m\omega_1^2}}\sin\omega_1\left(t-t_0\right)\]

que, atendendo à equação que permite escrever \(E_1\) como função de \(x_0\) e \(x'_0\), fica

\[x=x_0\cos\omega_1\left(t-t_0\right)+\frac{x'_0}{\omega_1}\sin\omega_1\left(t-t_0\right)\]

O mesmo procedimento conduz à solução para \(y\) na forma

 \[y=y_0\cos\omega_2\left(t-t_0\right)+\frac{y'_0}{\omega_2}\sin\omega_2\left(t-t_0\right)\]

O método apresentado neste exemplo vale para qualquer sistema que seja descrito pela função \(H\) que pode ser decomposta numa soma de funções, cada uma, dependendo de um subconjunto independente de variáveis.

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025

Calor e trabalho

No artigo enlinha Consequências da primeira e segunda leis da termodinâmica para sistemas reversíveis é considerado o sistema termodinâmico constituído por um gás ideal, sobre o qual as grandezas se determinam como função de duas delas. É, por exemplo, determinado o calor transferido ou a variação da energia interna num processo isotérmico em função do volume e da pressão. Porém, o cálculo de cada uma dessas grandezas efectua-se apenas ao longo de um determinado caminho de evolução do sistema que poderá corresponder a um processo isotérmico, a um isobárico ou a um adiabático. Com efeito, a variação calcula-se só depois de se determinar uma relação entre as variáveis independentes. A energia interna difere do calor pelo simples facto da sua variação não depender do caminho de evolução do sistema. Com efeito, não importando qual é o caminho de evolução que leva do ponto estado \(\left(p_0,v_0\right)\) ao ponto estado \((p,v)\), se tem sempre

\[\Delta U=U(p,v)-U\left(p_0,v_0\right)\]

independentemente do caminho de evolução. A variação do calor, por seu turno, como depende do caminho, o seu valor não poderá ser determinado do mesmo modo.

Considere-se um sistema descrito pelas duas variáveis independentes \(x\) e \(y\) onde a variação de uma quantidade \(dQ\) do ponto \((x,y)\) para o ponto infinitamente vizinho \((x+dx,y+dy)\) se possa escrever, até à primeira ordem,

\[Q(x+dx,y+dy)=Q(x,y)+pdx+qdy\]

ou

\[dQ=pdx+qdy\]

A variação finita da quantidade \(Q\) será dada pela soma infinita das suas variações infinitesimais ao longo de uma determinada curva. Essa variação será independente da curva se se verificar a condição

\[\frac{\partial p}{\partial y}-\frac{\partial q}{\partial x}=0\]

pois, neste caso, poder-se-á encontrar uma função \(F\) tal que

\[\left\lbrace\begin{array}{l}p=\frac{\partial F}{\partial x}\\ q=\frac{\partial F}{\partial y}\end{array}\right.\]

Assim, a variação finita de \(Q\) ao longo do caminho \(C\) é dada pelo integral

\[I=\int_C{pdx+qdy}=\int_C{\frac{\partial F}{\partial x}dx+\frac{\partial F}{\partial y}dy}\]

Se o caminho \(C\) for descrito, de um modo geral, pela parametrização

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x=x(t)\\ y=y(t)\end{array}\right.\]

então

\[I=\int_{t_0}^{t_1}{\left(\frac{\partial F}{\partial x}x'+\frac{\partial F}{\partial y}y'\right)dt}=\int_{t_0}^{t_1}{\frac{dF}{dt}dt}=F_1-F_0\]

em que se fez, para abreviar,

\[\left\lbrace\begin{array}{l}F_0=F\left(x_0,y_0\right)\\ F_1=F\left(x_1,y_1\right)\end{array}\right.\]

Nesta caso particular, a variação total da quantidade \(Q\) ao longo de um caminho fechado é nula pois \(F_1=F_0\). O mesmo não se verifica no caso em que

\[\frac{\partial p}{\partial y}-\frac{\partial q}{\partial x}\ne 0\]

Pretende-se determinar a variação total da quantidade \(Q\) quando se considera um caminho fechado tão próximo do ponto \(\left(x_0,y_0\right)\) quanto se queira. Seja esse caminho fechado definido pelas equações paramétricas

\[\left\lbrace\begin{array}{l}x=x_0+\varepsilon\eta(t)\\ y=y_0+\varepsilon\zeta(t)\end{array}\right.\]

em que \(\eta(t)\) e \(\zeta(t)\) são funções finitas, o parâmetro \(t\) varia desde \(t_0\) até \(t_1\) e \(\varepsilon\) é uma quantidade tão pequena quanto se queira. Da teoria da expansão em série de potências das funções advém a seguinte estimativa

\[\left\lbrace\begin{array}{l}p\left(x_0+\varepsilon\eta,y_0+\varepsilon\zeta\right)=p\left(x_0,y_0\right)+\varepsilon\left(\frac{\partial p}{\partial x}\eta+\frac{\partial p}{\partial y}\zeta\right)+\text{O}\left(\varepsilon^2\right)\\ q\left(x_0+\varepsilon\eta,y_0+\varepsilon\zeta\right)=q\left(x_0,y_0\right)+\varepsilon\left(\frac{\partial q}{\partial x}\eta+\frac{\partial q}{\partial y}\zeta\right)+\text{O}\left(\varepsilon^2\right)\end{array}\right.\]

A consideração do caminho especificado e da série de potências conduz ao resultado

\[\int_C{pdx+qdy}=\varepsilon I_1+\varepsilon^2I_2+\text{O}\left(\varepsilon^3\right)\]

onde

\[\left\lbrace\begin{array}{l}I_1=\int_{t_0}^{t_1}{\left(p_0\eta'+q_0\zeta'\right)dt}=0\\I_2=\int_{t_0}^{t_1}{\left(\frac{\partial p}{\partial x}\eta\eta'+\frac{\partial p}{\partial y}\zeta\eta'+\frac{\partial q}{\partial x}\eta\zeta'+\frac{\partial q}{\partial y}\zeta\zeta'\right)dt}\end{array}\right.\]

O primeiro integral é nulo na medida em que \(\eta\left(t_0\right)=\eta\left(t_1\right)\) e \(\zeta\left(t_0\right)=\zeta\left(t_1\right)\). Por seu turno, pode-se escrever

\[I_2=\frac{1}{2}\varepsilon^2\left(\frac{\partial p}{\partial y}-\frac{\partial q}{\partial x}\right)\int_{t_1}^{t_2}{\left(\zeta\eta'-\eta\zeta'\right)dt}+J\]

Porém, e pelo mesmo motivo,

\[J=\int_{t_0}^{t_1}{\left(\frac{\partial p}{\partial x}\eta^2+\left(\frac{\partial q}{\partial x}+\frac{\partial p}{\partial y}\right)\eta\zeta+\frac{\partial q}{\partial x}\zeta^2\right)'dt}=0\]

Segue, portanto, que

\[\Delta Q=\int_C{pdx+qdy}=\left(\frac{\partial p}{\partial y}-\frac{\partial q}{\partial x}\right)dA+\text{O}\left(\varepsilon^3\right)\]

onde

\[dA=\frac{1}{2}\varepsilon^2\int_{t_1}^{t_2}{\left(\zeta\eta'-\eta\zeta'\right)dt}\]

é o elemento de área delimitado pelo caminho considerado. Observe-se que se obtém o mesmo resultado, atendendo ao conhecido teorema que proporciona

\[\int_C{pdx+qdy}=\int_S{\left(\frac{\partial p}{\partial y}-\frac{\partial q}{\partial x}\right)dxdy}\]

onde \(C\) é o caminho fechado e \(S\) é a superfície no plano delimitada pelo caminho \(C\).

Se um sistema, ao realizar um ciclo, partindo e retornando ao mesmo estado, o excedente de calor deve ser compensado pelo excedente do trabalho realizado, do sistema no exterior e do exterior no sistema e, portanto,

\[\Delta(Q-W)=0\]

Ora, se se fizer

\[\left\lbrace\begin{array}{l}dQ=Q_xdx+Q_ydy\\ dW=W_xdx+W_ydy\end{array}\right.\]

a equação anterior reduz-se a

\[\frac{\partial U_x}{\partial y}-\frac{\partial U_y}{\partial x}=0\]

Se se fizer

\[dU=U_xdx+U_ydy\]

observa-se que se trata de um diferencial total, pois a sua variação entre dois pontos estado de um sistema não depende do caminho. A primeira lei da termodinâmica assume a forma

\[dQ=dU+dW\]

Deste ponto de vista, é suficiente considerar que deve ser nulo o balanço entre o calor transferido e o trabalho realizado quando o sistema realiza um ciclo sem a necessidade de postular, à partida, a existência de uma energia interna cuja variação não depende do caminho de evolução do sistema.