O princípio das velocidades virtuais
Há já alguns anos apresentei, em O princípio das velocidades virtuais, o princípio da alavanca e o princípio da composição do movimento como consequências do designado princípio das velocidades virtuais. Pretendo aqui expor algumas das outras mais conhecidas consequências no domínio da Estática. Na sua forma mais geral, o princípio das velocidades virtuais define-se do seguinte modo.
Seja um sistema constituído por um ou mais corpos ou pontos, cada um sujeito a um sistema de forças e suposto em equilíbrio estático. Suponha-se que se lhe pode aplicar um movimento tal que cada ponto se desloque uma distância tão pequena quanto se queira e que representa a sua velocidade virtual. A soma do produto de cada uma das forças pela distância percorrida pelo seu ponto de aplicação ao longo da linha de acção da força aquando do movimento do sistema é nula. Consideram-se como positivas as distâncias que variam no sentido da acção da força e negativas as que variam no sentido contrário a essas mesmas acções.
É importante salientar que as velocidades virtuais nada mais são do que deslocamentos infinitesimais. De um ponto de vista formal, se Fi forem forças que actuam sobre vários pontos de um sistema e se lhe aplicar um movimento infinitesimal, os pontos irão sofrer deslocamentos infinitesimais dρi na direcção das forças Fi. O princípio supracitado permite escrever
∑iFidρi=0
Dado que apenas quocientes entre quantidades infinitesimais fazem sentido, dividindo a equação anterior por dt, duração infinitesimal do deslocamento efectuado, fica
∑iFivi=0
em que a velocidade virtual vi é dada pelo quociente dρi/dt.
Aplicação a um sistema de forças sobre um ponto
Uma consequência directa do princípio das velocidades virtuais é de que qualquer sistema sujeito a um sistema de forças aplicadas sobre um ponto fixo encontra-se sempre em equilíbrio. Com efeito, qualquer que seja o movimento que se aplique ao sistema, o ponto não poderá sofrer qualquer deslocamento e, consequentemente, a sua velocidade virtual será nula, anulando os produtos pelas forças respectivas.
Considere-se agora um ponto sobre o qual actuam duas forças, F1 e F2, ao longo da mesma direcção ρ mas com sentidos contrários. Considerando um pequeno deslocamento dρ ao longo dessa mesma direcção, o princípio das velocidades virtuais permite escrever a equação (F1−F2)dρ=0. Segue-se que o ponto encontrar-se-á em equilíbrio se F1=F2. Caso as forças possuam o mesmo sentido, (F1+F2)dρ≠0 e o ponto não se pode encontrar em equilíbrio estático nessa situação. Suponha-se agora que a força F1 é aplicada no ponto em questão segundo a direcção e sentido do versor →u1 e a força F2 é aplicada no ponto segundo a direcção e sentido do versor →u2. Se se aplicar ao ponto um deslocamento infinitesimal dρ na direcção e sentido de um versor arbitrário →v, tem-se, para o deslocamento segundo a direcção de →u1, a quantidade →v⋅→u1dρ. Do mesmo modo, segundo a direcção de →u2 o deslocamento será dado por →v⋅→u2dρ. O princípio das velocidades virtuais formaliza-se na expressão
(→v⋅→u1F1+→v⋅→u2F2)dρ=0
Se se fizer →v=→u1 e →v=→u2, obtêm-se as equações do sistema
{F1+→u1⋅→u2F2=0→u1⋅→u2F1+F2=0
É claro que o sistema possui a solução trivial F1=F2=0. Porém, se →u1⋅→u2=−1, então F2=F1, que corresponde ao caso em que as duas forças se encontram segundo a mesma direcção mas com sentidos opostos. A única configuração para que um ponto sujeito a duas forças não nulas se encontre em equilíbrio é de que as forças deverão ter a mesma magnitude e estar orientadas segundo a mesma direcção mas em sentidos opostos.
Seja P um ponto onde são aplicadas as forças com magnitudes F1, F2 e F3 segundo as direcções →u1, →u2 e →u3, respectivamente. O procedimento acima exposto conduz ao sistema de equações
{F1+→u1⋅→u2F2+→u1⋅→u3F3=0→u1⋅→u2F1+F2+→u2⋅→u3F3=0→u1⋅→u3F1+→u2⋅→u3F2+F3=0
Se se designar por F o vector coluna com componentes F1, F2 e F3, e por U a matriz cujas colunas são definidas pelos vectores →u1, →u2 e →u3, o sistema anterior admite a forma matricial
UTUF=0
onde UT é a matriz transposta de U. O sistema possuirá soluções não nulas se o determinante da matriz U for igual a zero, isto é, atendendo às propriedades do determinante, se se puder escrever F3→u3=α→u1+β→u2. A substituição nas duas primeiras equações do sistema original resulta na equação matricial
U′TU′(F′+A)=0
onde U′ é a matriz cujas colunas são apenas os vectores →u1 e →u2, F′ é o vector coluna cujas entradas são dadas por F1 e F2 e A é o vector coluna dado por α e β. Ora, se o determinante de U′ for não nulo, a solução do sistema é dada por α=−F1 e β=−F2, advindo a condição de equilíbrio na forma
F1→u1+F2→u2+F3→u3=0
Se o determinante U′ for nulo, então é satisfeita a condição →u2=±→u1 e a solução anterior continua a valer para este caso.
Por intermédio do procedimento anterior, quando considerado sobre um número arbitrário de forças Fi que são aplicadas sobre um ponto P segundo as direcções e sentidos dos versores →ui, respectivamente, o princípio das velocidades virtuais permite concluir a condição de equilíbrio
∑iFi→ui=0
O ponto P encontra-se em equilíbrio se a resultante das forças que lhe são aplicadas for nula. Uma forma simples de mostrá-lo baseia-se na seguinte observação. Suponha-se que um sistema esteja em equilíbrio por estar sujeito a um conjunto de forças Fi definidas segundo as direcções dos versores →ui e a um conjunto de forças Gj segundo as direcções dos versores →vj. O princípio dos trabalhos virtuais escreve-se, após aplicar um deslocamento infinitesimal ao sistema,
∑iFidρi+∑jGjdσj=0
Suponha-se ainda que o sistema se encontra em equilíbrio após a aplicação das forças Gj segundo as direcções →vj e uma força H segundo a direcção do versor →w. Então, do princípio das velocidades virtuais vem
∑jGjdσj=−Hdη
A substituição na condição anterior resulta em
∑iFidρi−Hdη=0
Segue-se que o sistema constituído pelo conjunto de forças Fi aplicadas segundo as direcções dos versores →ui e a força H aplicada segundo o versor −→w mantém o sistema em equilíbrio. Pode-se afirmar que, no caso do equilíbrio, as forças Gj segundo as direcções →vj são equivalentes à força H segundo a direcção do versor −→w.
A demonstração segue facilmente daqui por intermédio de um argumento de indução. Com efeito, mostrou-se já que as forças F1, segundo o versor →u1, e F2, segundo o versor →u2 são equivalentes à força
R=‖
aplicada segundo o versor
\vec{v}=-\frac{F_1\vec{u}_1+F_2\vec{u}_2}{\left\|F_1\vec{u}_1+F_2\vec{u}_2\right\|}
já que, neste caso, se tem, no equilíbrio,
F_1\vec{u}_1+F_2\vec{u}_2=-F\vec{v}
Suponha-se, por hipótese de indução, que o conjunto das n-2 forças F_i segundo as direcções dos versores \vec{u}_i são equivalentes à força R dada por
R=\left\|\sum_{i=1}^{n-2}{F_i\vec{u}_i}\right\|
segundo o versor
\vec{v}=-\frac{1}{\left\|\sum_{i=1}^{n-2}{F_i\vec{u}_i}\right\|}\sum_{i=1}^{n-2}{F_i\vec{u}_i}
Então se o sistema de n forças F_i segundo a direcção dos versores \vec{u}_i se encontra em equilíbrio, tem-se
-Rd\sigma+F_{n-1}d\rho_{n-1}+F_nd\rho_n=0
onde d\sigma corresponde ao deslocamento virutal na direcção do versor \vec{v}. Mostrou-se atrás que o sistema anterior se encontrar em equilíbrio se
-R\vec{v}+F_{n-1}\vec{u}_{n-1}+F_n\vec{u}_n=0
isto é,
\sum_{i=1}^n{F_i\vec{u}_i}=0
de onde se segue que o sistema das n-1 forças F_i aplicadas segundo os versores \vec{u}_i é equivalente à força
F_n=\left\|\sum_{i=1}^{n-2}{F_i\vec{u}_i}\right\|
segundo a direcção do versor
-\frac{1}{\left\|\sum_{i=1}^{n-1}{F_i\vec{u}_i}\right\|}\sum_{i=1}^{n-1}{F_i\vec{u}_i}
como se pretendia mostrar.
Aplicação às alavancas
Considere-se uma alavanca composta por uma barra rígida com extremidades A e B que pode rodar livremente em torno do ponto fulcral P, considerado na origem do referencial, de tal modo que as extremidades distem de P em distâncias dadas respectivamente por r_A e r_B. Suponha-se que o segmento AB faz um ângulo \theta com o eixo das abcissas e sejam considerados dois pesos, P_A em A e P_B em B dirigidos segundo a vertical que terá a mesma direcção do eixo das ordenadas mas sentido contrário ao da sua progressão. Pretende-se determinar quais as magnitudes de P_A e P_B de modo a que o sistema se encontre em equilíbrio.
Ora, sendo \vec{j} o versor que toma a direcção e sentido do eixo das ordenadas, ambos os pesos tomam a direcção do versor -\vec{j}. O princípio dos trabalhos virtuais escreve-se
P_Ad\rho_A+P_Bd\rho_B=0
Dado que P é fixo, apenas um movimento de rotação pode ser aplicado sobre o sistema. Se se aplicar uma rotação d\theta no sentido directo, o ponto A delocar-se-á, no sentido do versor \vec{u}=\left(\sin\theta,-\cos\theta\right) em uma distância infinitesimal igual a r_Ad\theta. Por seu turno, o ponto B deslocar-se-á uma distância infinitesimal r_Bd\theta segundo o versor -\vec{u}. O movimento do ponto A segundo a direcção do peso em A é d\rho_A=-\vec{j}\cdot\vec{u}r_Ad\theta. Por seu turno, d\rho_B=\vec{j}\cdot\vec{u}r_Bd\theta. O princípio dos trabalhos virtuais adquire a forma
\left(P_Br_B-P_Ar_A\right)\cos\theta d\theta=0
Como d\theta\ne 0, tem-se a condição de equilíbrio P_Br_B=P_Ar_A quando \cos\theta\ne0. Se \cos\theta=0, o equilíbrio é verificado independentemente dos pesos que sejam aplicados nas extremidades da alavanca. Do ponto de vista físico, trata-se da configuração em que a alavanca se encontra totalmente na vertical e as linhas de força de ambos os pesos passam pelo ponto fulcral.
O método utilizado na determinação das condições de equilíbrio da alavanca requereu o resultado geométrico de que a rotação de um ponto em um ângulo d\theta em torno de um ponto central é efectuado ao longo da direcção perpendicular ao raio vector definido pelo ponto e o centro de rotação. Além disso, quando o ponto A se desloca segundo uma direcção, o ponto B desloca-se na mesma direcção mas em sentido contrário.
De modo a resolver o problema do movimento de uma forma analítica, pode-se considerar que a posição da alavanca é definida pelo múltiplo ordenado \left(x_A,y_A,x_B,y_B\right) constituído pelas coordenadas dos pontos A e B. De modo a simplificar a notação, considera-se que a posição da alavanca é determinada pelo par de vectores de posição \left(\vec{r}_A,\vec{r}_B\right) associadas àqueles pontos. O movimento dos pontos não poderá ser inteiramente livre dado que as distâncias entre ambos e as suas distâncias ao ponto fulcral P deverão ser constantes. As restrições podem ser descritas pelas equações
\left\lbrace\begin{array}{l} \vec{r}_A\cdot\vec{r}_A=r_A^2\\ \vec{r}_B\cdot\vec{r}_B=r_B^2\\ \left(\vec{r}_B-\vec{r}_A\right)\cdot\left(\vec{r}_B-\vec{r}_A\right)=\left(r_A+r_B\right)^2 \end{array}\right.
A combinação da última equação com as duas primeiras permite substituí-la pela condição
\frac{\vec{r}_A\cdot\vec{r}_B}{r_Ar_B}=-1
que indica que os vectores posição possuem a mesma direcção mas sentidos opostos. Se se considerarem coordenadas polares, isto é,
\left\lbrace\begin{array}{l} x_A=r_A\cos\theta_A\\ y_A=r_A\sin\theta_A\\ x_B=r_B\cos\theta_B\\ y_B=r_B\sin\theta_B \end{array}\right.
As duas primeiras condições permitem concluir que r_A e r_B são constantes. A terceira condição permite escrever \theta_A=\theta_B+(2k+1)\pi onde k é um número inteiro arbitrário. Se se fizer \theta=\theta_B, tem-se, para a configuração da alavanca,
\left\lbrace\begin{array}{l} x_A=-r_A\cos\theta\\ y_A=-r_A\sin\theta\\ x_B=r_B\cos\theta\\ y_B=r_B\sin\theta \end{array}\right.
Os princípios do cálculo diferencial são assim suficientes para justificar a intuição física utilizada acima na determinação da condição de equilíbrio da alavanca, já que
\left\lbrace\begin{array}{l} d\rho_A=-\vec{j}\cdot\frac{d\vec{r}_A}{d\theta}\\ d\rho_B=-\vec{j}\cdot\frac{d\vec{r}_B}{d\theta} \end{array}\right.
Consideração de coordenadas
O princípio dos trabalhos virtuais de um sistema de n pontos situados nas posições \vec{r}_i sobre os quais actual forças F_{ij} segundo a direcção dos versores \vec{u}_{ij} adquire a forma analítica
\sum_{i,j}{F_{ij}\vec{u}_{ij}\cdot d\vec{r}_i}=0
Note-se que se o sistema for sujeito a determinadas restrições, irão ser verificadas várias condições do tipo f_i\left(\vec{r}_1,\cdots,\vec{r}_n\right)=0, de tal forma que os diferenciais não sejam todos independentes.
Supondo, por exemplo, que o sistema sofre um pequeno movimento na direcção positiva do eixo das abcissas. Tem-se, neste caso,
\sum_{i,j}{F_{ij}\vec{u}_i\cdot\vec{i}dx_i}=0
onde \vec{i} é o versor que toma a direcção e sentido do eixo das abcissas. Ora, do mesmo modo se tem
\left\lbrace\begin{array}{l} \sum_{i,j}{F_{ij}\vec{u}_i\cdot\vec{j}dy_i}=0\\ \sum_{i,j}{F_{ij}\vec{u}_i\cdot\vec{k}dz_i}=0 \end{array}\right.
em que \vec{j} e \vec{k} são, respectivamente, os vectores que assumem a direcção e sentido dos eixos das ordenadas e das cotas. Se se definir \vec{F}_{ij}=F_{ij}\vec{u}_{ij}, vectores que representam a direcção, sentido e magnitude das forças, as três relações anteriores resumem-se à equação
\sum_{i}{\left(\sum_j{\vec{F}_{ij}}\right)\cdot d\vec{r}_i}=0
no caso em que os diferenciais dx_i, dy_i e dz_i são todos independentes entre si. Torna-se claro, a partir das expressões que a substituição de todas as forças aplicadas ao mesmo ponto \vec{r}_i é equivalente à aplicação de uma força resultante
\vec{R}_i=\sum_j{\vec{F}_{ij}}
sobre esse mesmo ponto, não importam quais as restrições que se verifiquem.
Considere-se de novo a alavanca com fulcro em P, considerado na origem, e cargas P_A e P_B nos pontos A e B às distâncias respectivas de r_A e r_B. A expressão analítica para este caso escreve-se
P_B\vec{j}\cdot\frac{d\vec{r}_B}{d\theta_B}d\theta_B+P_A\vec{j}\cdot\frac{d\vec{r}_A}{d\theta_A}d\theta_A=0
Note-se que as duas primeiras restrições do problema da alvanca implicam a constância de r_A e r_B. Mas, porque
\left\lbrace\begin{array}{l} \frac{d\vec{r}_B}{d\theta_B}=r_B\left(\sin\theta_B,-\cos\theta_B\right)\\ \frac{d\vec{r}_A}{d\theta_A}=r_A\left(\sin\theta_A,-\cos\theta_A\right) \end{array}\right.
e atendendo a que, por intermédio da terceira condição, \theta_A=\theta_B+k\pi, vem finalmente
\left(P_Br_B-P_Ar_A\right)\cos\theta d\theta=0
Trata-se da condição de equilíbrio obtida apenas com considerações analíticas.
Prevenção de translação e rotação
Seja novamente o sistema de n pontos situados nas posições \vec{r}_i, sobre os quais actuam as resultantes F_i segundo os versores \vec{u}_i. O movimento a que o sistema pode ser submetido pode ser decomposto num movimento de translação e num movimento de rotação comuns a todos os pontos e a um movimento relativo entre esses pontos. Suponha-se que o movimento relativo entre os pontos se encontra prevenido por um conjunto de restrições ou sistema de forças desconhecido.
Considera-se o deslocamento virtual permitido, aplicado simultaneamente sobre todos os pontos, descrito pelo vector de magnitude d\vec{r}_i=\vec{v}dt. A consideração do princípio das velocidades virtuais conduz a
\vec{v}\cdot\sum_{i=1}^n{F_i}\vec{u}_i=0
Mostrou-se acima que, dado que \vec{v} pode ser arbitrário, o princípio das velocidades virtuais proporciona a condição de equilíbrio
\sum_{i=1}^n{F_i}\vec{u}_i=0
Se um sistema de n pontos equidistantes se encontra em equilíbrio, a resultante das forças deverá ser nula.
Considera-se agora o movimento de rotação de um ângulo d\theta em torno do ponto \vec{\rho} e perpendicular ao eixo normal indicado pelo versor \vec{n}. Tal movimento, se definido por \vec{r}(t) terá de satisfazer as restrições
\left\lbrace\begin{array}{l} \vec{r}\cdot\vec{n}=0\\ \vec{r}^2=const \end{array}\right.
de onde se seguem as condições
\left\lbrace\begin{array}{l} \frac{d\vec{r}}{dt}\cdot\vec{n}=0\\ \vec{r}\cdot\frac{d\vec{r}}{dt}=0 \end{array}\right.
Segue-se que \frac{d\vec{r}}{dt} é simultaneamente perpendicular a \vec{r} e \vec{n} e pode ser dado por
\frac{d\vec{r}}{dt}=\alpha\vec{n}\times\vec{r}
O parâmetro \theta é escolhido de tal forma que \alpha=1 e, portanto,
\frac{d\vec{r}}{d\theta}=\vec{n}\times\vec{r}
O princípio dos trabalhos virtuais, quando é considerada uma rotação infinitesiamal, fica
\sum_{i=1}^n{F_i\vec{u}_i\cdot\vec{n}\times\left(\vec{r}_i-\vec{\rho}\right)}d\theta=0
ou, atendendo às propriedades do produto misto,
\vec{n}\cdot\sum_{i=1}^n{F_i\vec{u}_i\times\left(\vec{r}_i-\vec{\rho}\right)}d\theta=0
Como o sistema pode rodar em torno de uma normal arbitrária, tem-se finalmente
\sum_{i=1}^n{F_i\vec{u}_i\times\left(\vec{r}_i-\vec{\rho}\right)}=0
De um modo geral, se o sistema se encontrar em equilíbrio, a soma dos momentos das forças F_i calculados em relação a um ponto escolhido arbitrariamente é nulo. Ora, se as forças forem paralelas, e alinhadas com a direcção \vec{u}, então
\vec{u}\times\sum_{i=1}^n{F_i\left(\vec{r}_i-\vec{\rho}\right)}=0
e o sistema encontra-se em equilíbrio, relativamente ao movimento de rotação, se
\sum_{i=1}^n{F_i\left(\vec{r}_i-\vec{\rho}\right)}=\alpha\vec{u}
No caso da gravidade, F_i=-m_ig\vec{j}, tem-se
\sum_{i=1}^n{m_i\left(\vec{r}_i-\vec{\rho}\right)}=\alpha\vec{j}
onde \alpha condensa o sinal e o factor de aceleração g, isto é,
\vec{\rho}=\frac{1}{M}\sum_{i=1}^n{m_i\vec{r}_i}+\alpha\vec{j}
onde M=\sum_{i=1}^n{m_i} e \alpha é um número arbitrário. Conclui-se que o sistema não pode rodar em torno do ponto \vec{\rho} se este se encontrar na linha vertical que contém o centro de massa.
O princípio das velocidades virtuais como problema de extremos
Voltando à forma analítica do princípio das velocidades virtuais para um sistema de n pontos nas posições \vec{r}_i sujeitos às resultantes F_i segundo as direcções e sentidos dos versores \vec{u}_i,
\sum_{i=1}^n{F_i\vec{u}_i\cdot d\vec{r}_i}=0
O vector d\vec{r}_i é tangente à curva definida pelo ponto i durante o movimento virtual aplicado ao sistema. Designando por \vec{F}_i o vector F_i\vec{u}_i, tem-se
\sum_{i=1}^n{\vec{F}_i\cdot d\vec{r}_i}=0
Suponha-se que as forças \vec{F}_i são conservativas, isto é, existe uma função \varphi tal que
\vec{F}_i=\vec{\nabla}_i\varphi
onde \vec{\nabla}_i é o grandiente tomado relativamente às variáveis x_i. y_i e z_i. A relação para o equilíbrio pode-se escrever na forma
d\varphi=0
que corresponde ao problema da determinação dos extremos da função \varphi.
Por exemplo, se nas posições \vec{r}_i se encontrarem corpos de massa m_i sujeitos à força gravítica, tem-se
\varphi=-g\sum_{i=1}^n{m_iy_i}
O sistema de corpos encontrar-se-á em equilíbrio caso a altura y do centro de massa seja um extremo.
Resta determinar se o princípio dos extremos continua a valer no caso da existência de restrições. Ora, se o sistema se encontrar sujeito às m restrições dadas pelas condições
g_j\left(\vec{r}_1,\cdots,\vec{r}_n\right)=0
os respectivos diferenciais irão satisfazer as equações
\sum_{i=1}^n{\vec{\nabla}_ig_j\cdot d\vec{r}_i}=0
A forma analítica do princípio dos trabalhos virtuais é da forma
\sum_{i=1}^n{\vec{F}_i\cdot d\vec{r}_i}=0
O sistema é equivalente a
\sum_{i=1}^n{\vec{F}_i\cdot d\vec{r}_i}+\sum_{j=1}^m{\lambda_j\sum_{i=1}^n{\vec{\nabla}_ig_jd\vec{r}_i}}=0
quaisquer que sejam os valores escolhidos para \lambda_j uma vez que qualquer movimento virtual permitido pelas restrições mantém a segunda soma nula. Se se desconsiderarem as restrições, o sistema ficará em equilíbrio para valores específicos dos \lambda_j. O procedimento é equivalente ao da determinação dos extremos com o auxílio do método dos multiplicadores. Os valores
\lambda_j\left\|\vec{\nabla}_ig_j\right\|
proporcionam as forças de ligação que actuam no ponto situado na posição dada por \vec{r}_i.
De modo a ilustrar o que fora atrás exposto, considera-se um sistema constituído por dois pontos situados nas posições \vec{r}_1 e \vec{r}_2. Um dos pontos encontra-se sujeito à força F_1 segundo a direcção do versor \vec{u} e o outro encontra-se sob a acção da força F_2 segundo a direcção de -\vec{u}. Supondo que os dois pontos se encontram de tal forma ligados que a distância entre si não varia, pretende-se determinar a condição de equilíbrio.
Dado que o sistema constituído por dois pontos livres necessita de quatro variáveis para ser descrito, quando sujeito a uma restrição, o seu estado passará a ser descrito por três variáveis. É, portanto, necessário considerar três movimentos virtuais de modo a obter a condição de equilíbrio a partir do princípio dos trabalhos virtuais. Considera-se, para o efeito, a translação de ambos os pontos na direcção por eles definida, uma rotação infinitesimal em torno do primeiro ponto e uma rotação infinitesimal em torno do segundo.
Seja
d\vec{r}=\frac{\vec{r}_2-\vec{r}_1}{\left\|\vec{r}_2-\vec{r}_1\right\|}d\rho
o deslocamento virtual na direcção definida pelos dois pontos. O princípio dos trabalhos virtuais escreve-se, para este caso,
\left(F_1-F_2\right)\vec{u}\cdot\left(\vec{r}_1-\vec{r}_1\right)d\rho=0
O sistema encontra-se prevenido de se mover ao longo da direcção definida pelos dois pontos se F_1=F_2 ou a direcção de aplicação das forças é perpendicular à direcção do movimento e estas constituem um binário. Por seu turno, considerando uma rotação infinitesimal do primeiro ponto em torno do segundo tem-se
F_1\vec{u}\cdot d\vec{r}=0
Dado que F_1\ne 0, o primeiro ponto do sistema encontra-se prevenido de rodar em torno do segundo ponto se a linha de acção da força for perpendicular à direcção de rotação, isto é, se for paralela à direcção definida por ambos os pontos. O mesmo se passa quando se considera uma rotação infinitesimal do segundo ponto em torno do primeiro, mostrando que o sistema se encontra em equilíbrio se \vec{u} for colinear com \vec{r}_2-\vec{r}_1.
Aplique-se agora o princípio dos trabalhos virtuais, considerando a ideia dos multiplicadores. A restrição é definida por
\sqrt{\left(x_2-x_1\right)^2+\left(y_2-y_1\right)^2}-\delta=0
cujos gradientes são dados por
\left\lbrace\begin{array}{l} \vec{\nabla}_1g=-\frac{1}{\delta}\left(\vec{r}_2-\vec{r}_1\right)\\ \vec{\nabla}_2g=\frac{1}{\delta}\left(\vec{r}_2-\vec{r}_1\right) \end{array}\right.
O princípio das velocidades virtuais escreve-se, neste caso, como
\left(F_1\vec{u}-\lambda\frac{1}{\delta}\left(\vec{r}_2-\vec{r}_1\right)\right)\cdot d\vec{r}_1+\left(\lambda\frac{1}{\delta}\left(\vec{r}_2-\vec{r}_1\right)-F_2\vec{u}\right)\cdot d\vec{r}_2=0
Neste caso, qualquer movimento arbitrário pode ser aplicado ao sistema. Se se considerar apenas uma translação arbitrária do primeiro ponto, como foi acima mostrado, o equilíbrio poderá apenas ser atingido se
\vec{u}=\pm\frac{1}{\delta}\left(\vec{r}_2-\vec{r}_1\right)
e \lambda=\pm F_1. A aplicação do movimento arbitrário ao segundo ponto permite concluir o mesmo relativamente à sua direcção e sentido, bem como F_2=\pm\lambda e, portanto, F_1=F_2 como se tinha já determinado. O parâmetro \lambda consiste na força de ligação que anula a resultante das forças aplicadas em cada um dos pontos e deverá ser a mesma em ambos mas com sentidos opostos. Trata-se, com efeito, do princípio da acção-reacção.
Notas
O princípio das velocidades virtuais permite eliminar da consideração as forças de ligação. Se se pretender determinar alguma delas, é suficiente considerar o multiplicador associado às respectivas restrições. O princípio permite determinar o equilíbrio de forças no caso das roldanas fixas e móveis, nos casos dos eixos e plano inclinado. Este é o princípio que se pode considerar mais geral quando estendido ao caso de problemas em Dinâmica.